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MINISTÉRIO PÚBLICO: ATUAÇÃO NA ÁREA DA EDUCAÇÃO
(MINISTÉRIO PÚBLICO E EDUCAÇÃO: AVANÇOS, DILEMAS E DESAFIOS)
Luiz Antonio Miguel Ferreira1
- Introdução. 2. O direito à educação no Brasil. Evolução
histórica. 3. O Ministério Público e a educação. 4. Formas de
atuação. 5. Desafios frente as novas mudanças legislativas. 6.
Considerações finais. 7. Bibliografia. - INTRODUÇÃO
“A educação é reflexo, ela retrata e reproduz a sociedade; mas também projeta a
sociedade que se quer” (Selma Garrido Pimenta). Vivemos em uma sociedade que está em
constante evolução. E todos, independentemente da formação, apontam para a educação
como forma de propiciar o desenvolvimento do País e, consequentemente, da própria
sociedade. Diante deste contexto, o Ministério Público não poderia ficar afastado do
debate, posto que também atua como agente de transformação social, que tem na educação
elementos significativos para a sua função.
Essa relação que se firma entre a Educação e o Ministério Público nem sempre
restou evidenciada. Na verdade, foi com a evolução simultânea do direito à educação e à
mudança institucional do perfil do Ministério Público que os laços se estreitaram,
proporcionando uma atuação legal com a garantia do direito social e fundamental da
educação.
Historicamente, o Ministério Público sempre trabalhou com as consequências da
omissão decorrentes da ausência do direito à educação. A violência é um retrato deste
quadro. Buscar o controle social da violência implica o fortalecimento da escola, que por
sua vez, nem sempre foi considerada na atuação ministerial. Muitas vezes, não por
ausência de vontade do Promotor de Justiça de atuar preventivamente, mas,
principalmente, em face da omissão legislativa garantidora da ação.
No entanto, não há como negar que ocorreram avanços importantes no aspecto
legislativo, a partir do momento em que se analisa a trajetória histórica do direito à
educação e o seu estágio atual, da mesma forma que mudanças significativas foram
sentidas no perfil institucional do Ministério Público. Com esta nova sistemática, a atuação
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Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo. Mestre em educação.
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do Promotor de Justiça na área educacional é cada vez mais efetiva, abrangendo uma gama
de temas que requerem a sua especialização, não havendo espaço para amadorismo ou
improviso, pois os reflexos são sentidos de imediato por crianças e adolescentes em pleno
desenvolvimento. A consequência desse novo perfil institucional foi sentida por todo o
Ministério Público que tem procurado adaptar-se à nova realidade, criando centros de
apoio e promotorias especializadas na área educacional.
Decorre da nova realidade institucional uma mudança no perfil do Promotor de
Justiça que, ao invés de lidar com as consequências dos problemas decorrentes da ausência
da educação, atua preventivamente visando evitá-los. Também apontam tais mudanças
para o surgimento do fenômeno denominado de judicialização da educação, onde
demandas educacionais estão cada vez mais presentes nos debates judiciais.
O presente artigo busca traçar uma breve análise dessa evolução legal do direito à
educação e dos reflexos proporcionados na atuação do Ministério Público, tendo como
marco divisor a atual Constituição Federal que declara a educação como um direito de
todos, não mais como norma programática, mas de eficácia plena.
- O DIREITO À EDUCAÇÃO NO BRASIL. EVOLUÇÃO HISTÓRICA.
Devido à extensão territorial do Brasil e à maneira desordenada de sua colonização,
o direito à educação desenvolveu-se de forma desigual. No entanto, é possível constatar
algumas características próprias do desenvolvimento da educação brasileira, visto que os
temas se centraram na discussão sobre o ensino gratuito e privado; a obrigatoriedade da
educação; a análise quantitativa (universalidade e obrigatoriedade) e qualitativa da
educação; centralização e descentralização da política educacional; democratização do
ensino; ensino laico e religioso e sistema de financiamento da educação.
Estes temas perpassaram todo o desenvolvimento do ensino no País. Uma breve
análise dessa evolução confirma tal assertiva. Vejamos. Esclarece PAIVA (1987, p. 53)
que, no período colonial, a educação popular era praticamente inexistente. Excetuada a
ação dos jesuítas e outros religiosos nos primeiros momentos, quase nenhuma atenção era
dada à questão. O ensino ministrado tinha como objetivo principal cristianizar os indígenas
e difundir entre eles os padrões da civilização ocidental cristã. Mesmo nessa época, não
eram todos que tinham o direito a tal educação, pois diante da limitação de padres,
selecionavam os filhos dos caciques para receber instrução.
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Continua PAIVA (1987, p. 55) relatando que, com a introdução do regime
escravagista, também se buscava catequizar os negros, combatendo o culto dos deuses
africanos e difundindo-se entre eles o catolicismo. Mas a educação dos escravos não era
formal, a mesma era realizada através de sermões que exortavam a prática da moral cristã e
a fé católica. Porém, o regime de escravidão e as condições sociais do conjunto da
sociedade não propiciavam um interesse especial pelo ensino.
Até o final do século XVII, o sistema de ensino no Brasil foi entregue aos
religiosos. Somente no início do século XVIII, em função das necessidades de defesa da
colônia, mas com ênfase no século XIX, em face da vinda da família real portuguesa para o
Brasil, em 1808, é que se estabeleceu um sistema de ensino formal e oficial para atender à
demanda da aristocracia portuguesa. É neste período que surgem os cursos de nível
superior de medicina, agricultura, economia, direito, química e botânica. Entretanto, em
relação à educação elementar não ocorreu grande avanço, mantendo-se em situação
precária. As elites adotavam como prática de educação o ensino individual com preceptor
em suas próprias casas. A educação do povo não era sentida como uma necessidade social
e econômica forte.
Somente a partir de 1870, começaram a se multiplicar as preocupações com a
instrução elementar em face do desenvolvimento da economia brasileira. Então, passam a
valorizar a educação como instrumento de ascensão social.
A Proclamação da República reascende os ideais democráticos daqueles que
defendem uma maior ampliação do ensino primário, mas é certo que pouco avanço ocorreu
em relação à educação popular, em face da situação econômica reinante com o predomínio
das atividades rurais e consequente desinteresse pela instrução do povo, conforme
esclarece PAIVA (1987, pág. 79). O crescimento educacional era sentido apenas em parte
do Brasil, em especial na região centro-sul. Este crescimento, além de não atingir toda a
população em idade escolar, era marcado pela seletividade e pela exclusão, que permanece
até os dias atuais.
A partir da década de 90, pode-se constatar, através das estatísticas, que o perfil da
educação no Brasil melhorou. A taxa de analfabetismo reduziu, o número de matrículas
escolares aumentou e a escolaridade média cresceu. Houve um avanço significativo na
faixa dos 7 aos 14 anos de idade. Nesta faixa etária, alcançou-se um resultado muito
próximo à universalização. A educação de crianças de 0 a 3 anos constitui uma das
situações mais vulneráveis da educação pública.
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Este breve relato histórico aponta para a forma como a educação não foi constituída
legalmente como um direito de todos. E isto fica evidenciado quando se analisa a evolução
constitucional do direito à educação que foi lento e marcado por avanços e retrocessos.
Constituição do Império do Brasil – 22/04/1824
Em apenas dois incisos do artigo 179, que trata dos direitos civis e políticos,
regulamentou-se que a instrução primária seria gratuita a todos os cidadãos e que os
colégios e universidades seriam os responsáveis pelo ensino das ciências, letras e artes.
Esta Constituição foi caracterizada pela participação da Igreja Católica no processo de
educação do povo. “A gratuidade da instrução primária poderia ser considerada um
avanço, no entanto este regramento não dava meios para que se assegurasse o ensino a
todos os cidadãos”. No tempo do Império, o contingente de analfabetos era muito grande,
algo próximo a 83% para uma população de pouco mais de quatorze milhões de pessoas.
Constituição da República Federativa do Brasil – 24/02/1891
O tratamento dispensado à educação foi muito limitado, tratando da competência
referente à sua organização (descentralização), com a divisão das atribuições da União e do
Distrito Federal e da questão da laicidade (será leigo o ensino ministrado nos
estabelecimentos públicos), com uma ruptura da religiosidade na escola pública. Ponto
importante a destacar refere-se à questão da gratuidade do ensino. Ao contrário da
Constituição anterior, a de 1891 não fez qualquer menção a esse respeito.
Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil – 16/07/1934
A Constituição de 1934 teve como característica principal a positivação dos direitos
sociais. Nesse aspecto, a educação destaca-se, pois, além das linhas gerais traçadas no
corpo da Constituição, ganha um capítulo próprio, com o esmiuçar de um plano
educacional. Definiu a competência da União referente à educação, com a obrigatoriedade
de traçar as diretrizes da educação nacional, sem invalidar as iniciativas dos Estados, que
podem complementar as diretrizes nacionais. Coloca a difusão da instrução pública como
uma questão concorrente da União e dos Estados.
Dedicou todo um capítulo referente à “Educação e Cultura”, estabelecendo que: a
educação é um direito de todos, devendo ser ministrada pela família e pelos poderes
públicos (art. 149); a competência da União quanto à fixação do plano nacional de
educação; as diretrizes a serem seguidas no referido plano nacional; a educação religiosa
de caráter facultativo e ministrada de acordo com os princípios religiosos de cada aluno; a
liberdade de cátedra; o percentual que deve ser aplicado pela União, municípios (nunca
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menos de 10%), estados, e Distrito Federal (nunca menos de 20% da renda dos impostos)
na educação; a formação de fundos de educação, com a participação da União, estados,
municípios e o Distrito Federal; e a vedação da dispensa de concurso de títulos e provas
para provimento dos cargos do magistério oficial, garantindo aos professores nomeados
por concurso para os institutos oficiais, os princípios da vitaliciedade e inamovibilidade. É
nítido o avanço do direito à educação nesta constituição.
Constituição dos Estados Unidos do Brasil – 10/11/1937. O Estado Novo.
Há uma centralidade, na União, do poder de legislar a respeito do direito à
educação, como decorrência do autoritarismo característico do regime de poder. Foi
suprida a questão referente ao seu financiamento. O novo texto constitucional aponta a
responsabilidade dos pais quanto ao dever da educação, como o primeiro dever e um
direito natural, assumindo o Estado um papel supletivo e subsidiário.
Ao tratar, no capítulo próprio, a questão da “Educação e da Cultura” estabeleceu,
como princípios, a gratuidade e a obrigatoriedade do ensino primário, embora tal
gratuidade não exclua a cobrança, por ocasião da matrícula, de uma contribuição módica e
mensal; a criação de escolas profissionais, pelas indústrias e pelos sindicatos, para os filhos
dos operários e associados; as disciplinas de educação física, ensino cívico e trabalhos
manuais serão obrigatórios; o ensino religioso é facultativo.
Constituição dos Estados Unidos do Brasil – 18 de setembro de 1946.
O debate constituinte centrou-se na questão do ensino religioso nas escolas
públicas; do dever e o direito de educar, com o posicionamento do Estado e da família; da
liberdade do ensino, dos subsídios educacionais; da obrigatoriedade e gratuidade do
ensino; financiamento da educação e da responsabilidade das esferas do poder público em
relação à educação.
No capítulo destinado à educação e à cultura, regulamentou que a educação é um
direito de todos e obrigação da família e do Estado, calcada nos ideais de solidariedade
humana e liberdade. Como princípios fundamentais a serem seguidos pela legislação
infraconstitucional, estabeleceu a obrigatoriedade e a gratuidade do ensino primário; o
ensino religioso constitui disciplina escolar, mas de frequência facultativa; garante a
liberdade de cátedra e a vitaliciedade dos professores admitidos por concurso; as empresas
industriais, comerciais e agrícolas, com mais de cem pessoas, são obrigadas a manter o
ensino primário gratuito aos seus servidores e filhos. Como desdobramento da Constituição
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de 1946 (no período republicano), inicia-se com ela o ciclo das leis de diretrizes e bases.
A Lei nº 4.024, de 1961 foi a primeira lei geral de educação.
Constituição da República Federativa do Brasil – 24 de janeiro de 1967.
A Constituição de 1967 iniciou o trato do direito à educação, assegurando, no
âmbito da competência legislativa, a legitimidade da União quanto ao direito de
estabelecer os planos nacionais da educação.
No capítulo específico da educação, tratou de defini-la como um direito de todos,
de responsabilidade do lar e da escola, com atribuição do poder público e da iniciativa
particular. Considerou o ensino de sete aos catorze anos obrigatório e gratuito nos
estabelecimentos de ensino do Estado e o ensino religioso de natureza facultativa. O ensino
ulterior ao primário também será gratuito, mas criou a possibilidade de bolsas de estudo,
com posterior reembolso, no caso de ensino de grau superior. Estabeleceu uma dualidade
quanto à organização do ensino, ficando sob a responsabilidade da União o ensino nos
Territórios, enquanto os Estados e Distrito Federal tinham liberdade de organizá-lo,
aplicando-se, supletivamente, o sistema federal.
Constituição de 1969 – Emenda Constitucional nº 1, de 17/10/1969
No capítulo destinado à educação, repetiu algumas disposições contidas na
Constituição de 1967, alterando-a no que convinha ao poder instituído. Assim, exclui a
“igualdade de oportunidade” quando define o direito à educação e altera a “garantia da
liberdade de cátedra” pela “liberdade de comunicação de conhecimento no exercício do
magistério, ressalvado o disposto no artigo 154” que trata, exatamente, do abuso de direito
individual ou político, com o propósito de subversão ao regime democrático ou de
corrupção, com a possibilidade de suspensão dos direitos.
Instituiu a contribuição das empresas comerciais, industriais e agrícolas ao salário
educação (art. 178) e na questão da organização do município, estabeleceu a possibilidade
de intervenção, quando da não aplicação no ensino primário, em cada ano, de 20%, pelo
menos, da receita tributária municipal.
Constituição de 1988
Após contemplá-la como direito social, o legislador constituinte enfatizou o seu
conteúdo no título da ordem social, mais especificamente no capítulo da educação, cultura
e desporto. Estabeleceu como princípios da educação a igualdade de condições para o
acesso e permanência na escola; a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o
pensamento, a arte e o saber; o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e
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coexistência de instituições públicas e privadas de ensino; a gratuidade do ensino público
em estabelecimentos oficiais; a valorização dos profissionais do ensino, garantidos, na
forma da lei, planos de carreira para o magistério público, com piso salarial profissional e
ingresso, exclusivamente, por concurso público de provas e títulos; a gestão democrática
do ensino público na forma da lei e a garantia de padrão de qualidade.
Tratou da obrigação do Estado para com a educação (art. 208 – ensino fundamental
obrigatório e gratuito; progressiva universalização do ensino médio gratuito; atendimento
educacional especializado aos portadores de deficiência; atendimento em creche e préescola às crianças de zero a seis anos de idade; acesso aos níveis mais elevados do ensino e
pesquisa; oferta de ensino noturno regular; atendimento ao educando, no ensino
fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte,
alimentação e assistência à saúde)2
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Organizou o sistema de ensino garantindo-o à iniciativa privada (art. 209); tratou da
questão do ensino religioso como matéria facultativa (art. 210, § 1º); regulamentou a
questão da aplicação de recursos na Educação, fixando percentual mínimo de aplicação da
receita (art. 212 – União deve aplicar nunca menos que 18%; Estados, Distrito Federal e
Municípios – 25% da receita resultante de impostos) e os objetivos constitucionais da
educação (art. 214) como sendo a erradicação do analfabetismo; universalização do
atendimento escolar; melhoria da qualidade do ensino; formação para o trabalho;
promoção humanística, científica e tecnológica do País.
Foi o marco mais importante da educação quanto a um direito garantido a todos,
com mecanismos legais para exigir as obrigações do poder público. Deu tratamento
diferenciado à educação, se comparada às anteriores, destacando-a para concebê-la como
um direito público subjetivo. Para bem compreender esta relevância jurídica dada à
educação, esclarece KOZEN (1999, p. 09) que:
Até a vigência da atual Constituição, a educação no Brasil era
havida genericamente como uma necessidade e um importante fator de
2 A redação atual do art. 208 da CF. é a seguinte: O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia
de: I – educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua
oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria; II – progressiva universalização do ensino
médio gratuito; III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede
regular de ensino; IV – educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade; V – acesso aos
níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; VI – oferta de ensino
noturno regular, adequado às condições do educando; VII – atendimento ao educando, em todas as etapas da educação
básica, por meio de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.
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mudança social, subordinada, entretanto, e em muito, às injunções e aos
acontecimentos políticos, econômicos, históricos e culturais.
A educação, ainda que afirmada como direito de todos, não
possuía, sob o enfoque jurídico e em qualquer de seus aspectos,
excetuada a obrigatoriedade da matrícula, qualquer instrumento de
exigibilidade, fenômeno de afirmação de determinado valor como direito
suscetível de gerar efeitos práticos e concretos no contexto pessoal dos
destinatários da norma. A oferta de ensino e a qualidade dessa oferta
situava-se, em síntese, no campo da discricionariedade do administrador
público, ladeada por critérios de conveniência e de oportunidade.
Esta normatividade proporcionou a alteração da legislação infraconstitucional que
tratava do direito à educação, abandonando o caráter programático das normas para uma
atuação mais efetiva. Basta analisar a evolução da legislação que trata do direito da criança
e do adolescente para se constatar tal assertiva. As principais leis que trataram do direito
menorista também apontam para a evolução no trato do direito à educação. Vejamos.
Código de Mello Mattos – Decreto n° 17.943-A, de 12/10/1927
O direito à educação não foi objeto de análise minudente na citada legislação,
ocorreram apenas referências esparsas e destinadas a atender os menores abandonados
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ou
delinquentes. Quanto a esses últimos, extrai-se da referida legislação a criação dos
institutos disciplinares como escola de preservação (destinada a dar educação física,
moral, profissional e literária às menores, que a ela forem recolhidas por ordem do juiz
competente – destinava-se às meninas – art.199) e escola de reforma (destinava-se a
menores do sexo masculino e visava regenerar pelo trabalho, educação e instrução os
menores de mais de 14 anos e menos de 18, que forem julgados pelo juiz de menores e por
este mandados internar – art. 204).
Tanto para a escola de reforma como para a de preservação, estabelecia a Lei (art.
211) em que consistiam as matérias a serem lecionadas, especificando que:
a) A educação física deveria compreender a higiene, a ginástica, os exercícios
militares (para o sexo masculino), os jogos desportivos, e os exercícios próprios
para o desenvolvimento e robustecimento dos organismos.
b) A educação moral seria dada pelo ensino da moral prática, abrangendo os deveres
do homem para consigo, a família, a escola, a oficina, a sociedade e a Pátria. Era
facultada, aos internados, a prática da religião de cada um, compatível com o
regime escolar.
3 Como no artigo 55 que estabelece a possibilidade de a autoridade a quem incumbir a assistência e proteção aos
menores, ordenar a apreensão daqueles de que houver notícia, depositando em lugar conveniente para garantir sua
educação e vigilância.
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c) A educação profissional consistiria na aprendizagem de uma arte ou de um ofício,
adequado à idade, força e capacidade dos menores e às condições do
estabelecimento.
d) E a educação literária constará do ensino primário obrigatório.
Observa-se, portanto, que a questão educacional da legislação em análise, não é
tratada como direito fundamental, mas sim, como uma forma a se contemplar nas escolas
de reforma e de preservação. A educação, nesse contexto, prestava-se mais à garantia e ao
controle social do que ao pleno desenvolvimento do educando. Não tinha por objetivo o
menor cidadão.
Código de Menores – Lei nº 6.697, de 10/10/1979
Em seus 123 artigos, o Código de Menores não enfocou a questão relativa ao
direito à educação, nem mesmo da forma como tinha sido feita pelo Código Mello Mattos.
Fez apenas referência à escolarização quando tratou dos centros de permanência,
destinados a recolher os menores autores de infração penal, ou em situação irregular4
e
quando regulou as entidades que davam assistência ao menor, estabelecendo que essa
educação seria promovida preferentemente em estabelecimentos abertos5. Não se deu
ênfase aos direitos fundamentais dos menores na citada legislação, que buscou tratar da
questão das medidas de assistência e proteção (como a colocação em lar substituto,
liberdade assistida, semiliberdade e internação), medidas de vigilância (regulamentando a
entrada ou participação em espetáculos teatrais, cinematográficos, televisivos, casas de
jogos, bailes públicos e hotéis), as infrações administrativas praticadas em face do menor e
a questão processual.
Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA
O Estatuto representou a primeira legislação, após a edição da Constituição de
1988, a tratar do direito à educação para crianças e adolescentes, posto que editado em
- As leis posteriores que também lidaram com o tema, como a LDB, a que criou o
FUNDEF, datam de 1996 e o Plano Nacional de Educação é de 2001 (sendo que o novo
plano ainda não foi editado).
O ECA, diferentemente das leis mencionadas, destinou o capítulo IV, artigos 53 a
59, à educação, cultura, esporte e ao lazer. Os dispositivos esmiúçam os artigos 6, 205 a
4 Código de Menores – art. 9, § 2º – A escolarização e a profissionalização do menor serão obrigatórias nos centros de
permanência.
5 Código de Menores – art. 11 – Toda entidade manterá arquivo das anotações a que se refere o § 3º do artigo 9º. desta
lei, e promoverá a escolarização e a profissionalização de seus assistidos, preferentemente em estabelecimentos abertos.
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214 e 227 da Constituição Federal que, ao estabelecer os direitos sociais, colocou em
primeiro lugar a educação como direito de todos e dever do Estado e da família, promovida
com a colaboração da sociedade e por ela incentivada.
Com relação à educação, o Estatuto traçou os seguintes objetivos6
: a) pleno
desenvolvimento da criança e do adolescente; b) preparo para o exercício da cidadania; c)
qualificação para o trabalho.
Quanto aos direitos da criança e do adolescente, em relação à educação, o
Estatuto regulamentou-os nos incisos do artigo 53. O legislador apontou o dever do
Estado7
quanto à educação, pormenorizando as ações governamentais que conduzam ao
atendimento efetivo das pessoas nas creches, pré-escolas, no ensino fundamental e ensino
médio, além do atendimento especializado às pessoas com deficiência. Assegurou a
obrigação de garantir ensino noturno regular ao adolescente trabalhador e o
desenvolvimento de programas suplementares de material didático-escolar, transporte,
alimentação e assistência à saúde. Conclui o Estatuto que a educação escolar do ensino
fundamental constitui direito público subjetivo, ou seja, o Estado deve oferecer escola a
todos aqueles que se encontram em condições de frequentá-la.
Quanto à responsabilidade dos pais e responsáveis em relação aos filhos ou
pupilos em idade escolar, fixou o Estatuto: a) o direito de ter ciência do processo
pedagógico; b) participar da definição das propostas educacionais – parágrafo único do art.
53; c) a obrigatoriedade de matricular o filho na escola – art. 55.
O Estatuto estabeleceu, ainda, as obrigações impostas aos dirigentes dos
estabelecimentos de ensino, no art. 56, ou seja, comunicar ao Conselho Tutelar, os casos
de: a) maus tratos envolvendo os seus alunos; b) reiteração de faltas injustificadas e de
evasão escolar, esgotados os recursos escolares; c) elevados níveis de repetência.
Visando assegurar o direito à educação, o ECA constituiu o capítulo específico para
a proteção judicial dos interesses individuais, difusos e coletivos (arts. 208 a 224 ),
algumas ações de responsabilidade que poderão ser tomadas, referentes ao não
oferecimento ou oferta irregular de: a) ensino obrigatório; b) atendimento educacional
especializado aos alunos com deficiência; c) atendimento em creche e pré-escola; d) ensino
noturno regular; e) programas suplementares de oferta de material didático-escolar,
transporte e assistência à saúde do educando do ensino fundamental; f) serviço de
6 Estes objetivos estão previstos no art. 53 do ECA, que repetiu o estabelecido na Constituição Federal (art. 205). A LDB
também segue o mesmo enunciado (art. 2º).
7 Artigo 54 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
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assistência social visando proteção à família, à maternidade, à infância e à adolescência,
bem como o amparo às crianças e adolescentes que dele necessitem.
Mas não foi somente o Estatuto da Criança e do Adolescente que proporcionou
mudanças significativas na questão educacional. A própria Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (Lei nº 9.394/96) também caminhou no mesmo sentido, referendando
as mudanças constitucionais. Tanto que no título III, que trata do direito à educação e do
dever de educar, reiterou as obrigações do estado para com a educação. E logo a seguir,
estabeleceu que o acesso à educação básica obrigatória é direito público subjetivo,
podendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, organização
sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída e, ainda, o Ministério Público,
acionar o poder público para exigi-lo (art. 5º).
Em face deste quadro atual, não há como negar os reflexos que a Constituição
Federal e, posteriormente, o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional proporcionaram ao profissional que atua na área da educação,
infância e do direito. Com a mudança do perfil institucional, proporcionada pela
Constituição de 1988, o Ministério Público, especificamente, assumiu um papel relevante
na garantia do direito à educação, pois foi apontado como um dos legitimados ativos para
buscar a efetividade desse direito, quer através de ações judiciais ou extrajudiciais. Em
síntese, pode-se concluir que a atual constituição:
a) Garantiu a educação como direito de todos. Não mais como norma
programática, mas de eficácia plena e como direito público subjetivo.
b) Estabeleceu que essa educação deve ser de qualidade, para que se atinjam os
objetivos fixados no artigo 205 da CF, que são: o pleno desenvolvimento da
criança e do adolescente; o preparo para o exercício da cidadania e a
qualificação para o trabalho.
c) Estabeleceu as obrigações dos responsáveis pela educação, ou seja, da família e
do Estado.
d) Garantiu meios judiciais para que a educação seja efetivada da forma como
legislada.
e) Nomeou o Ministério Público como um dos legitimados para garantir a
educação de qualidade para todos, cobrando dos responsáveis diretos da
educação as suas obrigações.
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Especificamente em relação ao Ministério Público, há necessidade de serem
analisados os reflexos que a mudança legislativa proporcionou ao seu perfil institucional,
pois não há como negar que foi algo novo e diferente. Na verdade, representou uma
mudança de paradigma que implicou em uma nova forma de agir.
- O MINISTÉRIO PÚBLICO E A EDUCAÇÃO
Sabe-se que paradigma representa o conjunto de valores, ideias e práticas que
caracterizam as relações de uma sociedade com um determinado fenômeno. Na educação,
pode-se vislumbrar a mudança de paradigma quando se analisa a escola do passado com a
atual. No passado, a escola era tida como seletiva e excludente. Era uma escola para
poucos e aqueles que não se enquadrassem no seu perfil, eram excluídos, simplesmente
expulsos. Também se usavam métodos de seleção dos alunos como, por exemplo, o exame
de admissão. Por ser uma escola seletiva, apresentava uma educação de qualidade.
Contudo, repita-se, destinava-se apenas a uma pequena parcela da população, até porque a
grande maioria era excluída do sistema educacional. O índice de analfabetismo na época
era alarmante. Diferentemente desta escola e representando um novo paradigma, a atual
caracteriza-se como escola inclusiva, na qual é assegurada a educação para todos. Não é
por outra razão que a Constituição Federal estabelece a educação como um direito de
todos. Com esta diretriz, constata-se a implementação de políticas de democratização do
ensino, com a expansão do acesso à escola.
Diante do paradigma inclusivo, a escola sofreu uma mudança de perfil para
adequar- se à nova realidade. Isto porque, a educação para todos, implica colocar na escola
todas as crianças e adolescentes. Significa colocar uma diversidade de estudantes, com
características próprias e das mais diversas e variadas. Em outros termos, garante a
educação para 100% da população infanto-juvenil, com a inclusão de 100 % dos bons e
maus alunos, 100% dos alunos com deficiência, 100% dos alunos hiperativos, comportados
e mal comportados, violentos ou não, disciplinados ou indisciplinados. Esta multiplicidade
de alunos que hoje a escola recebe nos remete a uma primeira conclusão óbvia: educar hoje
é diferente de educar no passado. A escola de hoje é diferente da escola do passado e não
há como comparar sua atuação e intervenção diante de realidades tão diferentes.
Certo é que esta escola atual abarca todos os problemas sociais que a cercam. Os
conflitos comportamentais em face da diversidade dos alunos estão presentes. Assim, a
título de exemplo, a violência que estava fora da escola, hoje, faz-se presente dentro dela,
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posto que a escola não deve mais selecionar e sim incluir a totalidade dos alunos. Não se
trabalha mais com o aluno ideal, mas com o aluno real. Diante deste quadro, conclui-se que
o direito à educação não está mais restrito ao sistema educacional. Outros atores são
chamados para garantir a efetividade desse direito e dentre eles, o Ministério Público.
Este chamamento não ocorreu de forma aleatória. Isto porque, da mesma forma que
o direito à educação sofreu uma evolução legislativa, o perfil institucional do Ministério
Público também se apropriou de uma nova feição que viesse atender às novas demandas
constitucionais, como a garantia do direito à educação.
A princípio, a relação da educação com o Ministério Público mostrou-se muito
superficial, até certo ponto justificável, em razão da vocação penal da instituição. No
entanto, a partir do momento em que o Ministério Público foi assumindo novas atribuições,
principalmente na área dos direitos difusos e coletivos, também surgiu a preocupação com
a educação, mesmo diante da ausência de mecanismo legal de proteção.
A intervenção ocorria na esfera criminal em relação ao crime de abandono
intelectual8
e na área cível, de forma mais acentuada, em mandados de segurança em que
se discutiam relações educacionais, principalmente ligadas aos professores. Também
intervinha nas ações cíveis por força do artigo 829
do Código de Processo Civil.
Essa intervenção ganhou novo referencial com a Lei nº 7.347, de 24 de julho de
1985, que conferiu ao Ministério Público o inquérito civil e a legitimidade para a
propositura de ações para a proteção de interesses difusos e coletivos. A apropriação deste
instituto e os reflexos sentidos pela sociedade levou o legislador constituinte a dar um
tratamento sistematizado à instituição ministerial. E assim, a Constituição de 1988
estabeleceu:
Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial
à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis.
8
C. Penal – Abandono intelectual – art. 246 – Deixar, sem justa causa, de prover a instrução primária de filho em idade
escolar: Pena – detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.
9
C. Processo Civil – 82. Compete ao Ministério Público intervir: I – nas causas em que há interesses de incapazes; II –
nas causas concernentes ao estado da pessoa, pátrio poder, tutela, curatela, interdição, casamento, declaração de ausência
e disposições de última vontade; III – nas ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural e nas demais
causas em que há interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte.
14
Conforme afirma PAULA (2000, p. 194) a defesa da ordem jurídica, do regime
democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis caracteriza a instituição
como verdadeira “guardiã das liberdades públicas” e do Estado Democrático de Direito, na
medida em que o exercício de suas atribuições, judiciais ou extrajudiciais, visa, em
essência, ao respeito aos fundamentos do modelo social pretendido e à promoção dos
objetivos fundamentais do país. Por outro lado, a partir do momento em que a Constituição
de 1988 estabeleceu, no artigo 205, o dever do Estado em promover a educação, inclui o
Ministério Público como órgão integrante deste Estado a assumir o seu papel como
corresponsável pela efetivação do direito à educação, “cobrando posturas do Poder
Público, da família e da sociedade, auxiliando no desenvolvimento de políticas públicas
educacionais e exigindo suas implementações, fiscalizando a qualidade do ensino
oferecido e, de uma maneira geral, exigindo o cumprimento da norma que definiu a criança
e o adolescente como prioridades, acima de todas as demais” (MARTINES JÚNIOR,
2006, p.316-317).
Assim, para a garantia da cidadania e da dignidade da pessoa humana, o
desdobramento constitucional foi concretizado através do Estatuto da Criança e do
Adolescente – Lei nº 8.069/90 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº
9.394/96, que acabaram por consolidar a legitimidade e a titularidade do Ministério
Público para as questões educacionais, levando a instituição para um novo enfoque sobre
os temas relacionados à educação, que não mais se limitava a uma atuação como no
passado. O Ministério Público passou a ser um corresponsável pela efetividade do direito à
educação.
Esta nova relação apresenta algumas especificidades. A primeira vem da própria
Constituição Federal que, no artigo 6º, estabeleceu a educação como um direito social. E
nesse caso, o direito à educação, “assim como as demais políticas sociais, sofrem
interferência de orientações econômicas para a redução de gastos sociais com finalidades
de garantir as metas de estabilidade monetária, o controle da inflação e o equilíbrio fiscal,
de maneira a gerar sistemas de ensino mais eficientes com menores gastos” (SILVEIRA,
- p. 128).
Desta forma, temos um direito à educação que deve ser garantido para todos e que
tem restrições econômicas para a sua efetividade. Diante deste quadro, apresenta-se o
Ministério Público como a instituição responsável para garantir a educação para todos,
15
mesmo diante das limitações econômicas e dificuldades decorrentes da mudança de
paradigma.
Outra questão, envolvendo o Ministério Público e as dificuldades naturais
decorrentes da inovação, refere-se à necessidade de conhecimento do sistema educacional.
O direito à educação e a sua garantia processual são matérias que o Promotor de Justiça
deve dominar como decorrência de sua formação. No entanto, quando se analisa o sistema
educacional, constata-se a necessidade de um aprofundamento das questões não só de
natureza legal, como também administrativa e pedagógica, sob pena de se cometer atos
equivocados, apesar da melhor das intenções. Neste particular, dois exemplos elucidam a
questão: a) a matrícula de crianças antes dos seis anos de idade na educação infantil –
inúmeras ações judiciais garantem esta matrícula, contudo, há algo superior que deve ser
analisado quanto ao desenvolvimento biopsicológico desta criança e não somente o aspecto
etário limitador de eventual direito; b) da mesma forma, garante-se através de ação judicial
a vaga de criança em creches. Porém, há que se olhar para a qualidade da educação que
está sendo dispensada nas creches, sob pena de classes serem lotadas por cumprimento de
decisão judicial, sem garantir a qualidade com número determinado de crianças por
professor. Assim, na área educacional, o aspecto legal que cerca a atuação ministerial é
apenas um fator que deve ser analisado, mas não é o único. Outros fatores merecem análise
para se garantir uma atuação eficiente.
Ressalta-se, ainda, o problema da burocratização das ações judiciais ou
extrajudiciais. O processo judicial ou procedimento de natureza administrativa tem que ser
objetivo e célere, posto que a criança não pode esperar. Além da prioridade absoluta
estabelecida por lei, o seu desenvolvimento biopsciológico requer ações imediatas.
Exemplo desta intervenção refere-se à questão da evasão escolar. Procedimentos
burocratizantes (como por exemplo, trocas intermináveis de ofícios entre escola, conselho
tutelar, ministério público e judiciário) muitas vezes não resolvem o problema imediato do
retorno do aluno ao sistema educacional. As ações tem que ser efetivas e imediatas, mas
sempre com observância dos princípios e regras que cercam a matéria.
Por fim, como desdobramento desta nova ordem constitucional, impõe-se ao
Ministério Público a realização de trabalho articulado, e em rede, com o sistema
educacional. Quando se fala em educação, na verdade estamos tratando de uma questão
real, concreta e não de algo abstrato. Pensar em educação significa ter ciência de que a
mesma se constitui por pessoas, como o diretor, vice-diretor, coordenador pedagógico,
16
professores, funcionários e alunos. E mais, que esta educação também contempla outras
relações com a família e a sociedade. Não é por acaso que a Constituição Federal (art. 205)
estabelece que a educação é dever do Estado, da família e da sociedade em geral.
Contempla o direito à educação o sistema educativo de responsabilidade do Estado
(mais diretamente do Poder Executivo, com suas secretarias, diretorias de ensino, e
especificamente, diretores, vice-diretores, coordenadores pedagógicos, professores e
funcionários); o sistema de garantia dos direitos da criança e do adolescente – sociedade
(conselho municipal dos direitos da criança e do adolescente, conselho tutelar, juiz,
ministério público, defensor público, policia civil e militar) e a família. O que liga ou o
ponto comum desses sistemas, que justifica uma atuação articulada e em rede, é a criança e
o adolescente que devem ser tratados como prioridade absoluta e com dignidade. Tais
redes atuam como agente de integração do indivíduo na sociedade, diminuindo os riscos de
exclusão social. O Ministério Público também integra esta rede e não pode se despir de
uma ação articulada com os demais atores para atingir o seu objetivo.
Com estas observações, constata-se que a relação que se firma entre o Ministério
Público e a educação é complexa e exige cada vez mais a especialização da instituição para
cumprir o mandamento constitucional. Como afirma TATAGIBA (2006, p. 512), o
“Ministério Público promove o elo entre a sociedade e o Estado”, em outras palavras,
garante às crianças e adolescentes o direito à educação, sendo esta relação o fundamento de
sua existência institucional. - FORMAS DE ATUAÇÃO
A Constituição Federal de 1988 outorgou ao Ministério Público uma missão de
futuro, que se concretiza por intermédio das ações realizadas no presente. Para tanto, tem
que se adaptar às novas exigências legais e sociais, integrando-as em seu cotidiano, para
responder à necessidade e à complexidade dessas demandas. Implica um novo fazer. A
educação é o exemplo característico dessa nova realidade, da necessidade de uma ação
diferenciada, que não mais se satisfaz com a “intervenção à posteriori, ou seja, em relação
às consequências, mas para uma postura proativa, de opinar, auxiliar e exigir antes”
(MARTINES FILHO, 2006, p. 317). A ação institucional abarca um fazer que envolve
todo o sistema educacional: da criança ao adulto; da creche à universidade; da escola
pública à particular; sem contar com todo o aspecto humano: diretor, coordenador
pedagógico, professor, funcionários em geral, etc. Também envolve os problemas sociais
17
do cotidiano que refletem diretamente na relação ensinar/aprender, como a violência, os
grupos e gangues, gravidez e trabalho precoce e problemas relacionados à nova formatação
familiar. Pois, como aponta o Relatório da Situação Mundial da Infância (UNICEF, 2000,
p. 56), a educação não começa no momento em que a criança entra na escola, nem termina
quando o sinal toca indicando o fim das aulas. Logo, a atuação do Promotor de Justiça
deve ser a mais ampla possível.
Diante desse vasto rol de situações, pode-se afirmar que a atuação do Promotor de
Justiça, na área da educação, principalmente aquele que tem como atribuição a infância e a
juventude, volta-se, em primeiro lugar, para os responsáveis diretos da educação: família e
Estado, sem descuidar da atuação do próprio aluno. Esta atuação materializa-se de duas
formas: judicial; extrajudicial. Vejamos:
4.1 ATUAÇÃO JUDICIAL.
Como já afirmado, a partir de 1988, o Poder Judiciário passou a ter funções mais
significativas na efetivação do direito à educação. Inaugurou-se, no Poder Judiciário, uma
nova relação com a educação, que se materializou através de ações judiciais visando a sua
garantia e efetividade. Pode-se designar este fenômeno como a JUDICIALIZAÇÃO DA
EDUCAÇÃO, que significa a intervenção do Poder Judiciário nas questões educacionais
em vista da proteção desse direito até mesmo para se cumprir as funções constitucionais do
Ministério Público. A base legal desta atuação está no artigo 208 da Constituição Federal
que estabeleceu os deveres do Estado para com a educação
Art. 208 – O dever do Estado com a educação será efetivado
mediante a garantia de:
I – educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17
(dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para
todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria;
II – progressiva universalização do ensino médio gratuito;
III – atendimento educacional especializado aos portadores de
deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;
IV – educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5
(cinco) anos de idade;
V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da
criação artística, segundo a capacidade de cada um;
VI – oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do
educando;
VII – atendimento ao educando, em todas as etapas da educação
básica, por meio de programas suplementares de material didáticoescolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.
18
§ 1º – O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público
subjetivo.
Em face deste dispositivo, com eficácia plena, fica evidente que se o Poder Público,
diga-se Poder Executivo não cumpre com a sua obrigação poderá o interessado acionar o
Poder Judiciário visando a sua responsabilização. Pode-se resumir que a garantia do direito
à educação, sob o enfoque legal, ocorre quando qualquer uma das hipóteses previstas no
artigo supra referido não for atendida, bem como nas outras hipóteses previstas no Estatuto
da Criança e do Adolescente (art. 208), mas que, não excluem da proteção judicial outros
interesses individuais, difusos ou coletivos, próprios da infância e da adolescência,
protegidos pela Constituição e pela Lei (§ 1º, do artigo 208 do ECA).
Esse fenômeno da judicialização da educação é verificado em face da ocorrência de
fatores que impliquem na ofensa a esses direitos, decorrentes de a) mudanças no panorama
legislativo; b) reordenamento das instituições judicial, ministerial e escolar; c)
posicionamento ativo da comunidade na busca pela consolidação dos direitos sociais.
São exemplos de ações que foram propostas para a garantia do direito integral à
educação: melhoria de merenda escolar; transporte escolar; falta de professores; condições
para o desenvolvimento do aluno com deficiência – recursos materiais; adequação do
prédio escolar ao aluno com deficiência; vaga em creche e pré-escola; transferência
compulsória de aluno; problemas disciplinares (questionamentos de sanções disciplinares
aplicadas); criação de cursos; fechamento de sala de aulas; cancelamento de matrículas;
cuidador para a pessoa com deficiência; licença gestante de aluna; progressão continuada,
entre outras.
Da mesma forma, os genitores e responsáveis também poderão ser acionados em
face das normas constantes no Estatuto da Criança e do Adolescente e do Código Civil,
sofrendo as sanções decorrentes do não cumprimento do poder familiar, como também as
previstas nos artigos 129 e 249 do ECA.
Resta ainda, como forma de atuação judicial do Ministério Público, exercer a sua
vocação original, com a responsabilização penal dos genitores e administradores públicos
que não atentam para a concretização do direito à educação10
.
10 Lei nº 1079, de 1950, que trata dos crimes de responsabilidade do presidente da república, dos ministros de estados,
ministros do STF, Procurador Geral da Republica, governadores e seus secretários; Decreto Lei n° 201, de 1967, que se
refere à responsabilidade penal e das infrações político-administrativas de prefeitos e vereadores.
19
No entanto, essa atuação judicial merece uma atenção especial. Não é “porque a
Constituição enuncia o direito à educação, do modo como o faz que este direito será
cumprido. A enunciação do direito é apenas um ponto de partida” (VIEIRA e ALMEIDA,
2013, 12). Os citados autores apontam a necessidade de que “os juristas tenham mais
criatividade institucional”. Prosseguem: não podemos nos contentar, no século XXI, que
nossas instituições políticas e jurídicas reproduzam os modelos criados nos séculos XVIII e
XIX. Assim, o Ministério Público deve buscar alternativas para que a proteção judicial seja
efetiva e garantidora do direito e não apenas uma forma de transferir o problema para o
Judiciário.
4.2. ATUAÇÃO EXTRAJUDICIAL
Esclarece MARTINES JÚNIOR (2006, p. 286) que “afirmar que o Parquet é
essencial à função jurisdicional é verdadeiro, mas sua missão não se resume a isso. De fato,
as funções institucionais vão além da atuação judicial”. A atuação extrajudicial do
Promotor de Justiça, de igual importância e alicerçada na criatividade, materializa-se em
dois campos de ação: a) no inquérito civil; b) na comunidade/escola.
Na atuação extrajudicial, o inquérito civil apresenta-se como relevante mecanismo
de proteção do direito à educação. Tendo surgido no cenário jurídico brasileiro com a Lei
nº 7.347, de 24 de julho de 1985 (Lei de Ação Civil Pública), conferiu ao Ministério
Público a presidência do inquérito civil. Este instrumento legal possibilitou ao Promotor de
Justiça buscar uma atuação garantidora de direitos, independente de eventual propositura
de ação civil pública, posto que contempla a possibilidade de recomendações e termo de
ajustamento de conduta. Neste cenário, já se vislumbrava a atuação ministerial em algumas
questões ligadas à educação. Posteriormente, com a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990
(ECA), esta possibilidade se viu alargada, vez que ficou expressamente consignada na lei a
viabilidade de inquérito civil, sob a responsabilidade do Ministério Público11
para a
garantia do direito á educação12 em toda a sua plenitude.
11 Art. 223. O Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, ou requisitar, de qualquer pessoa,
organismo público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá
ser inferior a dez dias úteis.
12 ECA – Art. 208. Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos
assegurados à criança e ao adolescente, referentes ao não oferecimento ou oferta irregular: I – do ensino obrigatório; II –
de atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência; III – de atendimento em creche e pré-escola às
crianças de zero a seis anos de idade; IV – de ensino noturno regular, adequado às condições do educando; V – de
programas suplementares de oferta de material didático-escolar, transporte e assistência à saúde do educando do ensino
fundamental; VI – …; VII – …; VIII – de escolarização e profissionalização dos adolescentes privados de liberdade. IX – ….
20
Questões que não precisam ser necessariamente judicializadas, como o combate à
evasão escolar, inclusão do aluno com deficiência (transporte, professores capacitados,
acessibilidade, cuidador, insumos, etc.), adequação do transporte escolar, melhoria da
merenda, deficiências materiais das escolas e sua manutenção, transferência compulsória,
educação de jovens e adultos, educação para adolescentes infratores, entre outros temas,
recebem no inquérito civil o tratamento mais adequado e garantidor do direito à educação.
Estas e outras questões se resolvem através do termo de ajustamento de conduta firmado
no inquérito civil que, como o próprio nome indica, busca um acordo entre as partes para
que o direito pleiteado seja concretizado independente da propositura de ação civil pública.
Ainda na esfera extrajudicial, constata-se que a Constituição Federal de 1988 deu
ênfase à democracia participativa com a criação de conselhos federal, estadual e municipal.
Tais conselhos atuam em diversas áreas, mas, em especial, na educação. Especificamente
na área em estudo, temos conselhos de educação, do FUNDEB e da criança e do
adolescente. Atuam na formulação da política pública educacional, normatizando ações
que produzem reflexos em todo o sistema de ensino. Nesta seara, a participação do
Ministério Público é fundamental, pois age de forma preventiva e proativa, como fiscal da
lei, com uma visão mais ampla das questões que não se limitam aos aspectos pedagógicos.
Também englobam nessa atuação as questões relativas ao orçamento e sua aplicação ou à
adequação escolar em frente a novas demandas populacionais (ex. escolas a serem
construídas em novos conjuntos habitacionais ou assentamentos rurais).
De igual importância, apresentam-se as audiências públicas que podem ser
promovidas pelo Ministério Público13. Nestas audiências, a população alvo é chamada a
discutir diretamente um problema relativo à educação e quais os encaminhamentos a serem
dados. Como afirma MARTINES JÚNIOR (2006, p. 330): “essas discussões diretamente
com o povo ou a sociedade civil organizada permitem o afloramento de questões que não
seriam facilmente identificáveis, caso permaneça o órgão ministerial em seu gabinete”.
Pode ainda, o Ministério Público, articular reuniões periódicas com os integrantes
da rede educacional, ou mesmo do Conselho Tutelar, para estabelecer fluxos de atuação e
X – …. § 1o As hipóteses previstas neste artigo não excluem da proteção judicial outros interesses individuais, difusos ou
coletivos, próprios da infância e da adolescência, protegidos pela Constituição e pela Lei.
13 Lei nº 8.625/93 – art. 27. Cabe ao Ministério Público exercer a defesa dos direitos assegurados nas Constituições
Federal e Estadual, sempre que se cuidar de garantir-lhe o respeito: … IV – promover audiências públicas e emitir
relatórios, anual ou especiais, e recomendações dirigidas aos órgãos e entidades mencionadas no caput deste artigo,
requisitando ao destinatário sua divulgação adequada e imediata, assim como resposta por escrito.
21
integração da rede, como por exemplo, no combate à evasão escolar. Articular com a
comunidade ações direcionadas a determinada escola (ex. violência). Enfim, estas são
algumas hipóteses que pautam o Ministério Público na atuação extrajudicial. Contudo,
como já ressaltado, a criatividade da atuação neste campo é fundamental. Uma atuação
diferenciada e inovadora facilita e agiliza a concretização do direito à educação.
- DESAFIOS FRENTE ÀS NOVAS MUDANÇAS LEGISLATIVAS
Do que foi exposto, conclui-se que, na área educacional, a atuação do Ministério
Público é ampla e relativamente recente (com maior ênfase, a partir da Constituição de
1988). Porém, a instituição tem conseguido articular-se de maneira adequada para atingir
os seus objetivos. No entanto, vários desafios ainda se apresentam. Vale destacar dois
pontos: a) a questão da qualidade da educação; e b) uma mudança de postura institucional
na área educacional.
Quanto à qualidade, registra-se que não basta garantir escola para todos, há
necessidade de que esta escola seja de qualidade para propiciar o desenvolvimento pessoal
e social do educando e, para que os fundamentos e objetivos da República sejam
alcançados, assegurando, de maneira efetiva, a igualização de oportunidades. O Ministério
Público tem atuado visando garantir a educação para todos. Agora, as ações devem ser
direcionadas para uma educação de qualidade para todos. Isto porque a legislação
constitucional, secundada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional, estabelece que a educação é um direito de todos e que a
mesma deve ser de qualidade. Nesse sentido, apontam a Constituição Federal (art. 206,
VII; art. 211, § 1º), a Lei nº 9.394/96, (LDBEN) art. 3º, IX, art. 4º, IX, art. 7º. II, art. 9º, VI;
art. 47, § 4º; art. 70, IV; art. 71, I; art. 74; art. 75, caput; § 2º; a Lei nº 11.494/2007, que
regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e da
Valorização da Educação (FUNDEB), tratando, também, da questão da qualidade da
educação, anotando referências à qualidade da educação nos artigos 4º, § 2º; 7º; 8º, IV; 12;
13; 14; 30, IV; 36, §1º; 38, 39 e 40.
Como já afirmado, a Constituição Federal14 (art. 205), o Estatuto da Criança e do
Adolescente (art. 53) e a LDB (art. 2º) traçaram os seguintes objetivos para a educação: a)
desenvolvimento pleno da criança e do adolescente; b) preparo para o exercício da
cidadania; e c) qualificação para o trabalho. Tais objetivos visam uma diretriz única para
14 CURY e FERREIRA (2010, p. 81-87)
22
os fins da educação e traz à tona a questão da qualidade do ensino, posto que somente com
uma educação de qualidade se pode favorecer esse desenvolvimento, bem como o preparo
para a cidadania e qualificação para o trabalho. Um aluno que deixa o ensino fundamental
sem o conhecimento básico das disciplinas ministradas, sem saber ler e escrever
adequadamente, não se desenvolveu plenamente e pode ter comprometida a sua
qualificação para o trabalho. Neste caso, a educação não cumpriu o seu papel.
O Ministério Público não tratou especificamente da questão da qualidade da
educação. Lidou mais fortemente com a não qualidade. E a não qualidade, assevera Cury
(2007) é a falta de escolas, é a falta de vagas nas escolas, são as barreiras excludentes da
desigualdade social, inclusive legais como era o caso dos exames de admissão, a
discriminação que desigualava o ensino profissional, os limites do ensino não gratuito e a
descontinuidade administrativa. A não qualidade se expressou e ainda está presente nas
repetências sucessivas redundando nas reprovações seguidas do desencanto, da evasão e
abandono. Como diz Oliveira (2006): passávamos da exclusão da escola para a exclusão
na escola.
Em síntese, o debate sobre a qualidade da educação no âmbito judicial e
extrajudicial ainda está centrada em situações pontuais como a falta de vagas, falta de
professores, transporte, merenda, etc. Não se constata uma análise mais ampla no sentido
de se discutir uma ação afirmativa que pontue todas estas questões sob o signo da
qualidade. Esse é o desafio, que passa, obviamente, pela definição do que vem a ser
qualidade na educação.
O outro desafio diz respeito à forma de atuação ministerial. Trabalha-se ainda, com
um modelo que limita a atuação do Promotor de Justiça num âmbito territorial e com
atividade educacional ligada a várias áreas, como infância, patrimônio público, ou
consumidor. Este modelo serviu no passado, quando ainda estava sendo sedimentada a
ação do Promotor de Justiça na área da educação. Hoje, passados vários anos, constata-se
que há necessidade de uma readequação institucional. Promotorias especializadas e ações
regionalizadas apresentam-se como uma necessidade para que a ação seja efetiva e
garantidora de sucesso.
Problemas como violência, falta de vagas em creches, matrículas de crianças que
ainda não completaram a idade limite para o ingresso no ensino fundamental, bullying,
participação dos pais na gestão educacional, qualidade da educação, inclusão do aluno com
deficiência, entre outros, são temas comuns a toda questão educacional e não tem um
23
limite territorial, pois abrange regiões e até mesmo o próprio Estado. Enfrentar tais
questões de forma compartimentada e fragmentada não atende aos objetivos das ações do
Ministério Público. Daí porque a revisão da forma de atuação na área educacional é algo
que se impõe. É certo, porém, que em vários Estados já há um trabalho específico do
Ministério Público nesse sentido, com Promotorias de Justiça especializadas e ações
regionalizadas. Mas, el camino se hace al andar (o caminho se faz ao andar – Antonio
Machado). É prática diária do caminhar institucional que está proporcionando um novo
fazer e uma nova forma de agir do Promotor de Justiça. O Ministério Público caminha
nessa direção e se apresenta como a instituição com perfil para tratar adequadamente desse
tema educacional, como já demonstrou ao lidar com o meio ambiente, consumidor, e
outros tantos.
- CONSIDERAÇÕES FINAIS
O direito à educação, positivado na Constituição Federal de 1988 e esmiuçado na
legislação infraconstitucional, encontrou no Ministério Público uma das instituições
responsáveis para a sua concretização. Sabe-se que a “educação é a base para o
desenvolvimento humano e condição para o exercício da cidadania” (MARTINES
JÚNIOR, 2006, p. 313) e que é “um direito abrangente essencial para o exercício de todos
os outros direitos humanos” (SINGH, 2013, p. 23). Esta relação demonstra a importância
da atuação ministerial no campo educacional, pois visa garantir a todas as crianças e
adolescentes, não somente um direito, mas as mesmas oportunidades.
A realidade social e educacional aponta para uma desigualdade e ausência de
oportunidades que merecem a devida atenção de todos. Vários fatores poderiam ser
indicados para justificar esta conclusão, sendo que RIZZINI aponta para a questão social e
econômica, relacionada à pobreza e violação de direitos (como a educação) para afirmar
que criança e adolescente, em tese, têm os mesmos direitos, porém, na vida real,
perpetuam-se as desigualdades (2009, p. 87). FIGUEIREDO (2007, p. 14) direciona a sua
análise para a questão da constitucionalização do direito, ou seja, garantir à criança e ao
adolescente, como sujeitos de direitos e a educação como direito social “…é apenas o
primeiro passo na luta para que seja implementado; para que os direitos se tornem fato,
também é necessário que a sociedade esteja disposta a assumir as responsabilidades por
viabilizá-los, admitindo que a cada direito corresponde uma obrigação.”
24
Este é o desafio posto: alterar uma realidade marcada pela desigualdade, gerando
oportunidades para todos. O Ministério Público tem meios necessários, judiciais e
extrajudiciais, de contribuir para essa sociedade mais justa e igualitária. A educação é o
caminho. - BIBLIOGRAFIA
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