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A JUDICIALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO
Carlos Roberto Jamil Cury1
Luiz Antonio Miguel Ferreira2
- Introdução. 2. Justiça e Educação. 3. Educação e a
proteção judicial à educação. 4. Ato infracional. 5. Evasão
Escolar; 6. Qualidade da Educação; 7. Conseqüências da
judicialização da educação. 8. Considerações finais. 9.
Referência bibliográfica.
Resumo: O presente texto busca apresentar as relações que
se firmam entre o direito e à educação, com a conseqüente
intervenção do Poder Judiciário, Ministério Público e
Conselho Tutelar no cotidiano escolar, e os reflexos que
apresenta esta relação. - INTRODUÇÃO
A atual Constituição Federal de 1988 representou um marco significativo no
encaminhamento dos problemas relativos à educação brasileira, posto que estabeleceu
diretrizes, princípios e normas que destacam a importância que o tema merece.
Reconheceu a educação como “um direito social e fundamental, possibilitando o
desenvolvimento de ações por todos aqueles responsáveis pela sua concretização, ou
seja, o Estado, família, sociedade e a escola (educadores)” (FERREIRA, 2008, p. 37),
bem como a concebeu como um direito público subjetivo, assim compreendido como a
faculdade de se exigir a prestação prometida pelo Estado3
.
1
Professor Titular da UFMG (aposentado); Professor Adjunto da PUC Minas.
2
Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo. Mestre em educação pela UNESP.
Autor do livro: O Estatuto da Criança e do Adolescente e o Professor (Cortez, 2008).
3 E “se há um direito público subjetivo à educação, o Estado pode e tem de entregar a prestação
educacional” (José Cretella Júnior, apud MUNIZ: 2002, pág. 99).
2
Na verdade, estabeleceu uma verdadeira declaração de direitos relativos à
educação, que, segundo Oliveira (2001, p. 41) resumem-se em:
gratuidade do ensino oficial em todos os níveis;
garantia do direito aos que não se escolarizaram na idade ideal;
perspectiva da obrigatoriedade do ensino médio, substituída pela perspectiva de
sua universalização com a EC. 14;
atendimento especializado aos portadores de deficiência;
atendimento, em creche e pré-escola, às crianças até cinco anos de idade
(redação de acordo com a Emenda Constitucional n. 53/06);
oferta do ensino noturno regular;
previsão dos programas suplementares de material didático-escolar;
prioridade de atendimento à criança e ao adolescente.
Esta versão legal do direito à educação, dentro desse conjunto, não se mostrava
presente nas constituições passadas, e por conseqüência, no ordenamento jurídico
vigente. Até então, tínhamos boas intenções e proteção limitada com relação à
educação, mas não uma proteção legal, ampliada e com instrumentos jurídicos
adequados à sua efetivação. Basta analisar o que afirma KOZEN (199, p. 659) a respeito
do assunto:
Até a vigência da atual Constituição Federal, a educação, no Brasil, era
havida, genericamente, como uma necessidade e um importante fator de
mudança social, subordinada, entretanto, e em muito, às injunções e aos
acontecimentos políticos, econômicos, históricos e culturais. A normatividade
de então limitava-se, como fazia expressamente na Constituição Federal de
1967, com a redação que lhe deu a Emenda Constitucional n. 01, de 17 de
outubro de 1969, ao afirmar da educação como um direito de todos e dever do
Estado, com a conseqüente obrigatoriedade do ensino dos 7 aos 14 anos e a
gratuidade nos estabelecimentos oficiais, restringindo-se, quanto ao restante,
inclusive na legislação ordinária, a dispor sobre a organização dos sistemas de
ensino. Em outras palavras, a educação, ainda que afirmada como um direito
de todos, não possuía, sob o enfoque jurídico e em qualquer de seus
aspectos, excetuada a obrigatoriedade da matrícula, qualquer instrumento
de exigibilidade, fenômeno de afirmação de determinado valor como
direito suscetível de gerar efeitos práticos e concretos no contexto pessoal
dos destinatários da norma.
Assim, a partir da atual Constituição e das leis que se seguiram, a educação
passou a ser efetivamente regulamentada, com instrumental jurídico necessário para dar
3
ação concreta ao que foi estabelecido, pois de nada adiantaria prever regras jurídicas
com relação à educação (com boas intenções) se não fossem previstos meios para a sua
efetividade.
Desta forma, a partir de 1988, o Poder Judiciário passou a ter funções mais
significativas na efetivação desse direito. Inaugurou-se no Poder Judiciário uma nova
relação com a educação, que se materializou através de ações judiciais visando a sua
garantia e efetividade. Pode-se designar este fenômeno como a JUDICIALIZAÇÃO DA
EDUCAÇÃO, que significa a intervenção do Poder Judiciário nas questões
educacionais em vista da proteção desse direito até mesmo para se cumprir as funções
constitucionais do Ministério Público e outras instituições legitimadas.
Esta nova relação foi bem analisada, por exemplo, no artigo denominado A
JUDICIALIZAÇÃO DAS RELAÇÕES ESCOLARES E A RESPONSABILIDADE
CIVIL DOS EDUCADORES de autoria de Álvaro Chrispino e Raquel S. P. Chrispino,
onde o tema educação e direito voltou a ser debatido.
Como destacado no texto, os autores caracterizaram “a judicialização das
relações escolares como aquela ação da Justiça no universo da escola e das relações
escolares, resultando em condenações das mais variadas”, destacando que os
profissionais da educação não estão sabendo lidar com todas as variáveis que
caracterizam as relações escolares. Fundamentaram o texto no Código Civil, Estatuto da
Criança e do Adolescente e Código de Defesa do Consumidor para destacar a
responsabilidade civil dos educadores, apresentando várias decisões da Justiça brasileira
de ações envolvendo as escolas. Destacam, por fim, a necessidade de se firmar um novo
pacto entre os atores educacionais (professores, gestores e comunidade) a fim de
preparar os educadores para que possam dar direção e tomar decisões sobre o universo
escolar.
Os autores apontam a responsabilidade objetiva (dano e relação de causalidade,
sem a necessidade de demonstração de culpa) dos estabelecimentos de ensino (públicos
ou privados) nas relações escolares, como, por exemplo, na obrigação de guarda e
4
vigilância do aluno, acidentes que ocorrem em laboratório de química ou na aula de
educação física, e outras hipóteses, citando várias decisões a respeito.
Não obstante o citado artigo revelar, com muita propriedade, uma face da
judicialização das relações que se firmam com a escola e os educadores, ou seja, a
responsabilidade civil, não há como negar que outras relações também se verificam e
acabam por colocar a educação sob atribuições do poder judiciário. Este estudo busca
apresentar estas outras situações.
Isto porque, como já afirmado, a partir da Constituição Federal de 1988, com o
efetivo reconhecimento da educação como direito social e direito público subjetivo e da
judicialização destes direitos (saúde, educação, proteção à maternidade e a infância,
trabalho, segurança, lazer moradia), cada vez mais o poder judiciário está sendo
chamado a dirimir questões das mais variadas e que antes não eram levadas ao seu
conhecimento.
De sorte que, além da responsabilidade civil da escola e dos educadores, outras
demandas surgiram envolvendo estes atores. A consolidação dos direitos sociais
apresentou como reflexo uma nova faceta, que não tem precedente na história do
direito: uma relação direta entre a justiça e educação. Como a mesma ocorre? É o que se
passa a demonstrar.
- JUSTIÇA E EDUCAÇÃO.
A educação está regulamentada por meio do capítulo de educação na
Constituição Federal de 1988, e por meio de leis, como a do Estatuto da Criança e do
Adolescente (Lei n. 8.069/90), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n.
9394/96), o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e
Valorização do Magistério – FUNDEF, agora substituído pelo Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica e da Valorização dos Profissionais da Educação –
FUNDEB, o Plano Nacional de Educação, e inúmeros decretos e resoluções que
direcionam toda a atividade educacional, com reflexos diretos para os estabelecimentos
escolares e os sistemas de ensino onde estão presentes responsáveis pelo ensino como
5
diretores, coordenadores pedagógicos, supervisores, professores, os próprios alunos e
dirigentes de ensino seja dos órgãos executivos, seja dos órgãos normativos.
Essa legislação, em síntese, regulamentou a educação como um direito de todos
e um dever do Estado e da família, promovida e incentivada com a colaboração da
sociedade. Buscou a universalização do ensino público (em especial, do ensino
fundamental, dado seu caráter obrigatório), garantindo escola para todos, inclusive
àqueles que não tiveram acesso na idade própria, ou seja, uma educação para todos,
criando mecanismos para a sua garantia.
Não há como negar uma relação especial entre o direito (a lei) e a educação e a
necessidade de seu conhecimento para o pleno desenvolvimento de suas atividades,
apesar do desconhecimento de aspectos específicos da parte de muitos educadores o que
pode gerar posturas de resistência a essa novidade.
Com este paradigma, novas situações surgiram, envolvendo a escola e outros
atores que até então não participavam diretamente da questão educacional a não ser
esporadicamente. Com efeito, como a universalização e obrigatoriedade do ensino
(fundamental) implicam em colocar todas as crianças na escola, ou seja, todas as
crianças com suas características pessoais, o sistema educacional passou a conviver com
uma maior grandeza de diversidade sócio-cultural em que adentram a escola pelas
crianças com peculiaridades próprias. Tal situação faz aparecer pessoas com suas
individualidades rompendo com um imaginário homogeneizante.
Não que tal realidade relativa às peculiaridades não existisse, mas como a
educação era elitista e seletiva, a grandeza numérica associada a um perfil sócio-cultural
mais homogêneo não ganhava tanta expressão. Por exemplo, em 1950, de acordo com o
IBGE, pouco mais de 17% possuía o grau primário completo, o que impunha sérios
obstáculos à democratização do ensino para todos4
.
4 Nesse sentido afirma ESTEVES (1995, p. 96): A passagem de um sistema de ensino de elite para um
sistema de ensino de massas implica um aumento quantitativo de professores e alunos, mas também o
aparecimento de novos problemas qualitativos, que exigem uma reflexão profunda. Ensinar hoje é
diferente do que era há vinte anos atrás. Fundamentalmente, porque não tem a mesma dificuldade
6
Por outro lado, a atual legislação também acabou por estabelecer um sistema de
garantia dos direitos da criança e do adolescente (entre eles o direito à educação)
envolvendo o Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Segurança
Pública, Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente e Conselho Tutelar. Estas
instituições, chamadas a operar na área educacional e da infância e da juventude,
também não se apresentavam devidamente preparadas para tal desafio, até porque, os
conselhos de direitos e conselhos tutelares foram criados nesta oportunidade, ou seja,
inexistiam antes da vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente. O Poder
Judiciário e Ministério Público desempenhavam outras atividades na área menorista,
pouco voltada à questão educacional. A entrada da LDB e das leis reguladoras do
FUNDEF e do FUNDEB criaram os Conselhos de Acompanhamento e Controle dos
Recursos que devem ser aplicados na educação escolar.
Soma-se a esta situação o reconhecimento na Constituição Federal da educação
como o primeiro dos direitos sociais. Assim foi estabelecido:
Art. 6o
São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o
lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à
infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Este reconhecimento implica na obrigação do Poder Público de garantir a
educação visando a igualdade das pessoas e por outro lado, garante ao interessado o
poder de buscar no Judiciário a sua concretização.
A Constituição de 1988 foi além, estabelecendo, em capítulo próprio, várias
disposições relacionadas ao direito a educação e apontando ao Estado algumas
obrigações como, por exemplo:
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho.
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a
garantia de:
trabalhar com um grupo de crianças homogeneizadas pela seleção ou enquadrar a cem por cento as
crianças de um pais, com os cem por cento de problemas sociais que essas crianças levam consigo.
7
I – ensino fundamental, obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua
oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria;
II – progressiva universalização do ensino médio gratuito;
III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,
preferencialmente na rede regular de ensino;
IV – educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos
de idade;
V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação
artística, segundo a capacidade de cada um;
VI – oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;
VII – atendimento ao educando, no ensino fundamental, através de
programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e
assistência à saúde.
§ 1º – O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.
§ 2º – O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua
oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente.
§ 3º – Compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino
fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela
freqüência à escola.
Em face destes dispositivos, com eficácia plena, fica evidente que se o Poder
Público como Poder Executivo não cumpre com a sua obrigação poderá o interessado
acionar o Poder Judiciário visando a sua responsabilização.
Nesse sentido afirma MUNIZ (2002, p. 122) que as normas constitucionais que
disciplinam o direito à educação, ora visto como integrante do direito à vida, ora como
direito social, hão de ser entendidas como de eficácia plena e aplicabilidade imediata,
produzindo efeitos jurídicos, onde todos são investidos no direito subjetivo público, com
o efetivo exercício e gozo, indispensáveis para o pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Resulta desta situação uma relação direta envolvendo o direito e a educação,
sendo que a justiça passou a ser chamada amiúde a solucionar conflitos no âmbito
escolar, que extrapolam a questão da responsabilidade civil5
, ou seja, se antes se
contemplava na esfera do judiciário, ações de indenizações ou reparação de danos
envolvendo o sistema educacional, ou mandados de segurança para garantia de
atribuições de aulas a professores, hoje, a realidade é bem diversa, e várias são as
5 E até mesmo a responsabilidade penal, posto que poucas são as informações que mostram a aplicação do
art. 246 do Código Penal, que estabelece o crime de abandono intelectual, prevendo: Art. 246 – Deixar
sem justa causa de prover à instrução primaria de filho em idade escolar – Pena: Detenção de quinze dias
a um mês e multa.
8
situações em que se provoca o judiciário com questões educacionais. A efetividade do
direito à educação prevista no Constituição Federal, a ocorrência de atos infracionais
ocorridos no ambiente escolar e a garantia da educação de qualidade passaram a ser
objeto de questionamento judicial.
- EDUCAÇÃO E A PROTEÇÃO JUDICIAL À EDUCAÇÃO
Do que foi exposto, pode-se resumir que a garantia do direito à educação, sob o
enfoque legal, ocorre nos seguintes tópicos:
Universalização do acesso e da permanência da criança e do adolescente;
Gratuidade e obrigatoriedade do ensino fundamental;
Atendimento especializado aos portadores de deficiência;
Atendimento em creche e pré-escola às crianças de 0 a 5 anos de idade;
Oferta de ensino noturno regular e adequado às condições do adolescente
trabalhador;
Atendimento no ensino fundamental por meio de programas suplementares de
material didático-escolar, transporte alimentação e assistência à saúde;
Direito de ser respeitado pelos educadores;
Direito de contestar os critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias
escolares superiores;
Direito de organização e participação em entidades estudantis;
Acesso à escola próximo da residência;
Ciência dos pais e ou responsáveis do processo pedagógico e participação na
definição da proposta educacional;
Pleno desenvolvimento do educando e
Preparo para o exercício da cidadania e para o trabalho.
Qualidade da educação;
Quando um destes direitos relacionados à educação não for devidamente
satisfeito pelos responsáveis públicos ou, quando for o caso, privados, gera aos
interessados, a possibilidade do questionamento judicial. Daí o surgimento da
JUDICIALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO, que ocorre quando aspectos relacionados ao
9
direito à educação passam a ser objeto de análise e julgamento pelo Poder Judiciário.
Em outros termos, a educação, condição para a formação do homem é tarefa
fundamental do Estado, é um dos deveres primordiais, sendo que, se não o cumprir, ou
o fizer de maneira ilícita, pode ser responsabilizado (MUNIZ, 2002, p. 211). Esta
responsabilização com a intervenção do Poder Judiciário consolida o processo de
judicialização da educação.
Este fenômeno se verifica em face da ocorrência de fatores que impliquem na
ofensa a esse direito decorrentes de:
a) Mudanças no panorama legislativo;
b) Reordenamento das instituições judicial e escolar;
c) Posicionamento ativo da comunidade na busca pela consolidação dos direitos
sociais.
A nova legislação, que reconhece a criança e o adolescente como sujeitos de
direitos; a educação como direito social e público subjetivo; que garante a busca pelos
interessados da efetividade e consolidação deste direito; a acessibilidade da Justiça, com
mudança de paradigma em relação a questões como educação, saúde, criança e
adolescente; o surgimento da intervenção de outras instituições como Conselho Tutelar
e Ministério Público apresentam-se como fatores determinantes deste novo fenômeno: a
judicialização da educação.
Como afirmado, o paradigma atual é o da educação para todos. Os índices de
escolaridade aumentaram significativamente, demonstrando que após o novo comando
constitucional, está ocorrendo a efetiva matrícula das crianças no ensino obrigatório,
cumprindo-se a determinação legal. Diante desta nova realidade e dos conflitos e
problemas oriundos desta relação, fica evidente que a intervenção judicial não mais se
limita a questões como a da responsabilidade civil dos educadores ou criminal dos pais
ou responsáveis. Novos questionamentos relacionados à educação são levados
diariamente ao Poder Judiciário, que passou a ter uma relação mais direta, com uma
visão mais social e técnica dos problemas afetos à educação.
10
Decorre desta nova realidade, o chamamento do Poder Judiciário por parte do
próprio interessado (aluno e/ou responsável), Ministério Público, Defensores Públicos
ou Conselho Tutelar com inúmeras hipóteses de judicialização das relações
educacionais6
. Para além da garantia de acesso ao ensino público de qualidade, são
exemplos de situações que envolvem o Poder Judiciário e a educação, entre outras7
:
a. MERENDA ESCOLAR:
A Constituição Federal (art. 208, VII), o Estatuto da Criança e do Adolescente
(art. 54, VII) e a LDB (art. 4.º, VIII) e a meta 18 de capítulo do ensino fundamental do
Plano Nacional de Educação estabelecem a necessidade de atendimento ao educando,
no ensino fundamental, de programa suplementar de alimentação. Assim, o
fornecimento e a qualidade da alimentação passaram a ser objeto de análise judicial,
como se observa das seguintes ementas:
Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal em face do
Município de Sapé – PB e FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação. A ação tramita perante o Tribunal Regional Federal da Paraíba –
Seção judiciária – 2007.82.00.008137-5. Consta como pedido da ação civil
pública: a) a regularização do fornecimento da merenda escolar, conforme o
cardápio elaborado, sem deixar faltar um item sequer para a elaboração dos
alimentos, inclusive os envolvidos na preparação (açúcar, óleo, gás de cozinha,
água filtrada, etc.), promovendo a adequação do programa a todas as exigências
previstas na lei e no regulamento; b) providencie a adequação das condições de
transporte de alimentos perecíveis às escolas situadas fora do núcleo urbano,
disponibilizando para tanto acondicionamento adequado por meio de freezers,
etc. c) providencie a adequação das condições das escolas para a conservação
e armazenamento dos gêneros alimentícios, disponibilizando água
encanada, filtros, geladeiras, armários, e tudo o mais necessário conforme as
normas de correta manipulação de alimentos previstas pela Vigilância Sanitária;
d) Sejam disponibilizadas merendeiras ou servidores habilitados para o
manuseio e preparo de alimentos para todas as escolas municipais, no prazo de
60 (sessenta) dias; e) seja estruturado o CAE – Conselho de Alimentação
Escolar – para seu perfeito funcionamento mediante a disponibilização de sala de
reuniões, computador, telefone, secretária e veículo para realização de inspeções
e vistorias
6
Pode-se obter mais informações a respeito destas instituições através dos sites: www.tj.sp.gov.br,
www.mp.sp.gov.br , www.mj.gov.br/defensoria ; www.stj.gov.br
7 Nos tópicos seguintes são citadas ementas (súmulas – resumos) de decisões dos Tribunais bem como de
ações promovidas pelo Ministério Público (ação civil pública ou inquéritos civis) relacionadas à
educação.
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Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Estado de Olinda –
PE visando o fornecimento de merenda escolar aos beneficiados, assim
considerados os alunos matriculados na pré-escola e no ensino fundamental da
rede municipal, sob pena do pagamento de 10.000 (dez mil reais) por dia de
atraso, com fundamento do artigo 213, parágrafos 2º e 3º, da Lei nº 8.069/90 e
artigo 214 da mesma legislação, sem prejuízo de eventual responsabilidade
criminal.
b. TRANSPORTE ESCOLAR:
Da mesma forma como mencionado no item anterior, a Constituição Federal
(art. 208, VII), o Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 54, VII) e a LDB (art. 4.º,
VIII), meta 17 capítulo do ensino fundamental do Plano Nacional de Educação, também
estabelecem a necessidade de atendimento ao educando, no ensino fundamental, de
programa de transporte. Nesse sentido, apontam as decisões a seguir:
APELAÇÃO CÍVEL – Apelo voluntário da Municipalidade – Contagem
de prazo que se submete à regra do art. 198, II, do ECA, ainda que aplicado em
dobro, em razão do disposto no art. 188 do Código de Processo Cível –
Intempestividade da apelação do Município – Não conhecimento – Reexame
necessário – Transporte escolar que deve ser providenciado, gratuitamente,
a todos os estudantes, crianças e adolescentes do Município, das zonas
urbanas e rural – Inteligência dos arts. 30, VI, 211, par. 2º e 227 da
Constituição Federal, combinados com os arts. 54, I e VII e 208, I e V, do ECA
– Improvimento. “Apelação Cível nº 59.494-0/0 – Comarca de Ituverava – TJSP
– Relator Des. Nigro Conceição – j. 09/11/00.
MANDADO DE SEGURANÇA – Impetração objetivando compelir o
Município de Buritizal a fornecer transporte escolar a aluno do ensino
fundamental residente na zona rural – Segurança concedida corretamente em
primeiro grau – Constituição Federal que impõe aos entes estatais o dever de
assegurar o ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os
que a ele não tiveram acesso na idade própria, preconizando amplo
atendimento ao educando através da implementação de programas
suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e
assistência à saúde (art. 208, I e VII) – Reexame necessário (pertinente na
espécie) e apelo da Municipalidade não providos (Apelação Com Revisão
5383415200 – Relator(a): Paulo Dimas Mascaretti – Comarca: Igarapava –
Órgão julgador: 8ª Câmara de Direito Público – Data do julgamento: 16/07/2008
- Data de registro: 22/07/2008 )
AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Objetivo – Fornecimento de transporte
escolar gratuito para crianças e adolescentes – Procedência –
Admissibilidade – Dever constitucional do Estado e do Município –
Garantia do livre acesso ao ensino fundamental – Possibilidade, ademais, de
12
fixação de multa cominatória pelo descumprimento – Recursos não providos
(Apelação Cível nº 241.185-5/0-00. Apelantes: Prefeitura Municipal de Teodoro
Sampaio e Fazenda Pública Estadual – Apelado: Ministério Público).
MANDADO DE SEGURANÇA – Adolescente acometida de paralisia
cerebral, com tetraparesia espática e síndrome convulsiva – Necessidade de
transporte especializado – Obrigação imposta à Municipalidade – Segurança
concedida – Apelo visando à reforma do julgado – Recurso improvido
(Apelação Cível nº 110.690-0/5-00, da comarca de São Paulo. Apelante:
Municipalidade de São Paulo. Apelado: Promotor de Justiça da Vara da Infância
e da Juventude do Foro Regional de Santana).
PROCESSUAL CIVIL. Agravo regimental. Falta de prequestionamento.
Transporte escolar gratuito. Universalização do ensino. Responsabilidade e
dever do estado. Obrigação de fazer. Descumprimento. Multa. Cabimento. Prazo
e valor da multa. Necessidade de apreciação do conjunto probatório. (AgRg no
Ag 646.240/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA,
julgado em 05.05.2005, DJ 13.06.2005 p. 178)
c. FALTA DE PROFESSORES:
A falta de professores prejudica o pleno desenvolvimento do educando, regra
básica prevista na Constituição Federal (art. 205), Estatuto da Criança e do Adolescente
(art. 53) e LDB (art. 2, 12 e 13). Por outro lado, a LDB estabelece toda uma política de
organização educacional (arts. 10 a 13) e normas relativas aos profissionais da educação
(art. 67) que, uma vez desrespeitada, enseja medida judicial, como a ação a seguir
mencionada:
Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Estado do
Amapá objetivando que o Estado do Amapá imediatamente lote professores em
todas as disciplinas ministradas nas seguintes escolas da rede estadual sediadas
na Cidade de Calçoene: Professor Sílvio Elito da Lima Santos, Amaro Brasilino
de F. Filho e Lobo Dálmada, fixando multa diária a ser paga pessoalmente pelo
senhor secretário de Estado da Educação, no caso do não-cumprimento da
obrigação, conforme previsto no art. 213, § 2º, do ECA;
É certo que esta questão é extremamente complexa, posto que nem sempre a
decisão judicial encontra efetividade, posto que em muitos situações não existem
professores habilitados ou interessados nas vagas abertas. A intervenção judicial, neste
caso, somente encontrará resultado, desde que ocorra demanda para as vagas existentes.
13
d. CONDIÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO DO ALUNO COM
DEFICIÊNCIA:
O atendimento educacional especializado ao aluno com deficiência,
preferencialmente na rede regular de ensino (CF., art. 208, III, ECA., art. 54, III e LDB.,
art. 4º, III) provocou medidas judiciais para a garantia deste direito, conforme se
observa a seguir:
APELAÇÃO CÍVEL – Ação civil Pública com pedido de tutela
antecipada. Criança portadora de paralisia cerebral infantil aliada a retardo
mental. Liminar deferida. Procedência da ação sob pena de multa diária,
condenando o apelante a inserir a criança em unidade de educação infantil
(Apelação cível n. 149.237-0/9-00 – São Paulo – TJSP – Câmara Especial – voto
n. 3.636).
AÇÃO CIVIL PUBLICA – Fornecimento de tratamento a portadores de
síndrome de autismo – Educação especializada – Art. 5º CF – Norma
constitucional de proteção à saúde pública – Controle jurisdicional dos atos
discricionários – Garantia de direito à saúde pública – Recurso não provido.
(Apelação Cível n° 564.314.5/5-00-00 – Comarca de São Paulo. Apelante: Juízo
ex officio. Apelado: Victor Martucelli (menor representado por genitora)
APELAÇÃO CÍVEL – Mandado de Segurança com pedido de Liminar –
Portadora de Deficiência Física – Direito a ensino especializado – Legalidade –
Dever do Município – Inteligência dos Artigos 208, I e III da CF; 227 “Caput” da
CE; e da Lei 7853/89 – Sentença Mantida – Recursos oficial e voluntário do
Secretário da Fazenda Municipal de Araçatuba Improvidos. (Apelação Cível n°
279.484-5/7-00. Comarca: Araçatuba. Apelante: Secretário Municipal da
Fazenda de Araçatuba e Outro. Recorrente: Juízo “ex-officio”. Apelada: Maria
Luiza Domingues Cardoso (menor representada por sua mãe).
Ensino Especializado Criança com retardo no desenvolvimento
neuropsicomotor, atraso na fala e epilepsia. Inexistência de escola especializada
na rede pública. Necessidade de garantir plena efetividade ao direito à educação
Inteligência do artigo 208 da CF, artigo 249, § 1°t da CE, Lei n° 8 069/1990
(ECA), Leis Federais n° 7.853/1989 e 9.394/1996 Segurança concedida para
determinar a matrícula do impetrante em instituição particular de ensino
especializado Recurso voluntário e reexame necessário não providos (Apelação
n° 752.718.5/4-00 – Comarca: Campinas (Paulinia). Apte: Prefeitura Municipal
de Paulinea. Apdos: Paulo Eduardo Rodrigues da Silva (rep. p/ genitora) e outro.
e. ADEQUAÇÃO DO PRÉDIO ESCOLAR:
O atendimento do aluno com deficiência, requer a adequação da unidade escolar.
Esta regra está prevista na Constituição Federal (art. 227, § 2º e 244) e em leis
14
específicas como a Lei nº. 7.853, de 24 de outubro de 1989 (art. 2º, parágrafo único), o
Decreto nº. 3.298, de 20 de dezembro de 1999 (art. 24 e 46) e a Lei nº. 10.098, de 19 de
dezembro de 2000 (art. 11, 12 e 21) que estabeleceu normas para a promoção da
acessibilidade das pessoas com deficiência mediante a supressão de barreiras e
obstáculos.
O Plano Nacional de Educação, aprovado pela Lei n. 10.172/2001, estabeleceu
como um dos objetivos e metas da educação básica a acessibilidade das escolas, com a
adaptação para o atendimento do aluno com deficiência. Assim, várias são as ações
visando dar cumprimento a esta previsão legal.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Obrigação de Fazer – Interesse difuso –
Adaptação de prédio de escola pública para portadores de deficiência física
– Obrigação prevista nos artigos 127, par. 2º e 244 da CF, artigo 280 da CE –
Legitimidade ativa do Ministério Público – Lei Federal nº 7853/89 –
Inexistência de violação do princípio da violação da separação dos Poderes –
Multa diária para o caso de descumprimento da obrigação – Inexistência de
ilegalidade – Artigo 644 do CPC – Recurso provido para julgar a ação
procedente (Apelação Cível nº 231.136-5/9-00, da Comarca de Ribeirão Preto.
Apelante: Ministério Público. Apelada: Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto).
AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Objetivo – Facilitação do acesso de
deficientes físicos em escola pública estadual – Obrigação de fazer por parte
do Estado – Exegese dos artigos 227, parágrafos 2º e 244 da Constituição da
República e das Leis Estaduais nºs. 5500/86 e 9086/95 – Recurso provido.”
(Apelação Cível nº 244.235-5/0-00, da comarca de Ribeirão Preto. Apelante:
Ministério Público. Apelado: Fazenda Pública Estadual”.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Deficiente físico – Acesso as salas de aula
em escola pública dificultado por escadas – Obrigação de fazer consistente
na realização de obras para as devidas adaptações do prédio –
Admissibilidade – Direito de livre circulação em imóvel de uso comum
assegurado na Constituição Federal de 1988, sobretudo a escola pública, que
deve facilitar o quanto se pode o acesso ao ensino – Norma cuja aplicabilidade
não pode ser condicionada à edição de lei estadual, que, passados dezesseis anos
da Constituição Federal, não foi providenciada, constituindo reprovável conduta
que fere princípios éticos e ostenta flagrante inconstitucionalidade por omissão –
Ação procedente – Recursos improvidos (Apelação Cível nº 275.964-5/9-00, da
comarca de Ribeirão Preto. Apelante: Fazenda Pública Estadual. Apelado:
Ministério Público).
15
f. VAGA EM CRECHE E PRÉ-ESCOLA:
Existem ainda as hipóteses em que não se garantiu o oferecimento adequado de
educação para todos, em especial para creche e pré-escola às crianças de 0 a 5 anos de
idade8
, gerando também a intervenção judicial:
CRIANÇA DE ATÉ SEIS ANOS DE IDADE. ATENDIMENTO EM
CRECHE E EM PRÉ-ESCOLA. EDUCAÇÃO INFANTIL. DIREITO
ASSEGURADO PELO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL (CF, ART.
208, IV). COMPREENSÃO GLOBAL DO DIREITO CONSTITUCIONAL À
EDUCAÇÃO. DEVER JURÍDICO CUJA EXECUÇÃO SE IMPÕE AO
PODER PÚBLICO, NOTADAMENTE AO MUNICÍPIO (CF, ART. 211, § 2º).
RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E IMPROVIDO. - A educação infantil representa prerrogativa constitucional indisponível, que,
deferida às crianças, a estas assegura, para efeito de seu desenvolvimento
integral, e como primeira etapa do processo de educação básica, o atendimento
em creche e o acesso à pré-escola (CF, art. 208, IV). - Essa prerrogativa jurídica, em conseqüência, impõe, ao Estado, por efeito da
alta significação social de que se reveste a educação infantil, a obrigação
constitucional de criar condições objetivas que possibilitem, de maneira
concreta, em favor das “crianças de zero a seis anos de idade” (CF, art. 208, IV),
o efetivo acesso e atendimento em creches e unidades de pré-escola, sob pena de
configurar-se inaceitável omissão governamental, apta a frustrar, injustamente,
por inércia, o integral adimplemento, pelo Poder Público, de prestação estatal
que lhe impôs o próprio texto da Constituição Federal. - A educação infantil, por qualificar-se como direito fundamental de toda
criança, não se expõe, em seu processo de concretização, a avaliações
meramente discricionárias da Administração Pública, nem se subordina a razões
de puro pragmatismo governamental. - Os Municípios – que atuarão, prioritariamente, no ensino fundamental e na
educação infantil (CF, art. 211, § 2º) – não poderão demitir-se do mandato
constitucional, juridicamente vinculante, que lhes foi outorgado pelo art. 208,
IV, da Lei Fundamental da República, e que representa fator de limitação da
discricionariedade político- -administrativa dos entes municipais, cujas opções,
tratando-se do atendimento das crianças em creche (CF, art. 208, IV), não
podem ser exercidas de modo a comprometer, com apoio em juízo de simples
conveniência ou de mera oportunidade, a eficácia desse direito básico de índole
social.
8 Várias decisões referem-se à pré-escola para crianças até 6 anos de idade. Contudo, alteração da
Constituição Federal promovida pela Emenda Constitucional n. 53, de 2006 ao artigo 208, IV,
estabeleceu como dever do estado a educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 anos de
idade.
16
- Embora inquestionável que resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e
Executivo, a prerrogativa de formular e executar políticas públicas, revela-se
possível, no entanto, ao Poder Judiciário, ainda que em bases excepcionais,
determinar, especialmente nas hipóteses de políticas públicas definidas pela
própria Constituição, sejam estas implementadas, sempre que os órgãos
estatais competentes, por descumprirem os encargos político-jurídicos que
sobre eles incidem em caráter mandatório, vierem a comprometer, com a sua
omissão, a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de
estatura constitucional. A questão pertinente à “reserva do possível”. (Recurso
extraordinário 541.281-4 São Paulo- relator: min. Celso de Mello – recorrente:
município de São Paulo – advogado: Luiz Henrique Marquez – recorrido:
Ministério Público do Estado de São Paulo).
MENOR – Mandado de Segurança – Creche municipal – Garantia de
vaga à criança – Requisitos ensejadores presentes – Recurso oficial
improvido. (Apelação Cível 1641620600 – Relator: Eduardo Pereira (Comarca:
F.D. Paulínia/Campinas. Órgão julgador: Câmara Especial – Data do julgamento:
30/06/2008 – Data de registro: 17/07/2008 )
EDUCAÇÃO – Mandado de segurança visando matrícula de menor
impúbere em creche – Alegação da municipalidade de insuficiência de vagas
para atender à demanda – fato que não exime a administração de cumprir
sua obrigação não podendo se beneficiar da própria omissão – Segurança
concedida – Recursos Improvidos. (Apelação Com Revisão 7356475500 –
Relator: Luiz Burza Neto – Comarca: São José do Rio Preto . Órgão julgador:
12ª Câmara de Direito Público. Data do julgamento: 25/06/2008 . Data de
registro: 14/07/2008).
MANDADO DE SEGURANÇA – Direito das crianças à creche –
Garantia constitucionalmente prevista – Responsabilidade prioritária do
Município pelo atendimento da educação infantil – Imposição de obrigação
de fazer ao Município como decorrência da própria atividade jurisdicional –
Violação do princípio da Independência dos Poderes não configurada – Recursos
improvidos. (Apelação Cível 1639550800 – Relator: Viana Santos. Comarca:
Campinas. Órgão julgador: Câmara Especial. Data do julgamento: 23/06/2008.
Data de registro: 04/07/2008).
MENOR – Apelação – Ação civil pública para compelir o Município à
abertura de matrículas na rede de ensino infantil a todas as crianças de zero a
seis anos de idade, sem exceção – Legitimidade do Ministério Público
reconhecida – Dever estatal com a educação – Competência municipal para o
atendimento em creches e pré-escolas das crianças de zero a seis anos –
Necessidade que se equivale à obrigatoriedade – Sentença de procedência
mantida -Recurso improvido. (Apelação n° 63.969.0/2-00. Recorrente:
Município de Assis. Recorrido: Promotor de Justiça da Vara da Infância e
Juventude de Assis).
17
g. OUTRAS HIPÓTESES:
A intervenção judicial nas questões educacionais ocorre da forma mais diversa
possível e em relação a temas variados. Tendo sempre como fundamento a Constituição
Federal, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Estatuto da Criança e do
Adolescente, Pareceres e Resoluções dos Conselhos de Educação e portarias, as
decisões a seguir, refletem a relação estabelecida entre a Justiça e a Educação e os
inúmeros temas que são levados a julgamento.
TRANSFERÊNCIA COMPULSÓRIA DE ALUNO
APELAÇÃO CÍVEL – Mandado de Segurança – Ensino – Transferência
compulsória de aluno – Não obediência ao “due process of law” –
Descabimento da medida – Concessão da segurança. Recurso provido. (Apelação
Cível n° 252 557 5/3-00 – Votuporanga Apelante Valdonir da Silva – Apelado
Diretor da Escola Estadual Cecília Meireles e Conselho da Escola Estadual
Cecília Meireles)
MANDADO DE SEGURANÇA — Transferência compulsória de
aluno — Necessidade de preservação do direito de defesa no processo
administrativo — Recurso improvido (APEL. n°: 148.524-5/0. COMARCA:
Garça. Apte: Juízo Ex-Officio. Apelado: Marcus Vinícius Marques Ogeda –
menor representado por sua mãe Ana Luiza César Marques Cavalcante).
PROBLEMAS DISCIPLINARES:
ENSINO ESTADUAL – Freqüência do aluno ao estabelecimento em que
se encontra matriculado – Questões disciplinares ensejaram transferência de
escola – Inexistência de direito líquido e certo – Ordem denegada – Recurso
desprovido. (AC n° 382.260.5/1-00 – Serra Negra – 2a Vara Cível – Voto n°
13.715 – Apte. Juliano Matrandrea de Barros Silveira (AJ). Apd°. Diretora da
Escola Estadual Jovino Silveira).
MANDADO DE SEGURANÇA. Suspensão do direito da utilização de
serviço público gratuito, por motivo disciplinar. Observância do devido
processo legal e direito de defesa. Não desatende ao devido processo legal e não
exclui o direito de defesa, a suspensão do beneficio (transporte escolar gratuito)
por motivo de indisciplina, se precedida da devida notificação ao responsável
que, não obstante, não adotou nenhuma providência corretiva Segurança mal
concedida. Recurso oficial provido para denegar a segurança (Apelação Cível n°
115.743.5/2-00, da Comarca de Palestina, em que é recorrente o Juízo. Ex
Officio e recorrida Ana Rosa Araújo Gavião Silva).
18
CRIAÇÃO DE CURSOS
Ação Civil Pública. Criação de vagas em curso de ensino médio –
Princípio da Inafastabilidade da jurisdição. Ingerência do Judiciário na
Administração Pública inocorrente. Possibilidade/necessidade para garantia de
direito constitucional. Repercussão orçamentária que não afasta a imposição
constitucional. Obrigação de fazer regularmente imposta por preceito
constitucional. (Tribunal de Justiça de São Paulo – Apelação Cível n.
335.913.5/3-00. Comarca de Sumaré. Recorrente: Fazenda Pública do Estado de
São Paulo. Apelado: Ministério Público).
FECHAMENTO DE SALA DE AULAS:
Mandado de Segurança – Autoridade de Ensino não pode suprimir
salas de aulas, com fundamento na Resolução n. 97/2004 e Resolução SE n.
125/98, as quais violam o disposto nos artigos 208 e seus incisos e 227, “caput”
todos da Constituição Federal. As referidas Resoluções apenas determinam que a
matrícula do aluno deverá respeitar o turno de seu trabalho, inclusive dos que
comprovarem ser aprendizes, na forma do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Desta forma, o ato da autoridade impetrada que implicou em retrocesso social,
fato expressamente vedado pelos artigos 208 e seus incisos e 227 “caput” todos
da Constituição Federal violou direito líquido e certo dos alunos. (Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo. Apelação Cível 427.364-5/2-00. Comarca de
Pacaembu. Apelante: Fazenda do Estado de São Paulo. Apelado: Ministério
Público.
CANCELAMENTO DE MATRÍCULAS:
Ação Civil Pública – Determinação da Secretaria de Educação que
cancelava a matrícula de crianças e adolescentes que não comparecessem
nos primeiros dez dias do ano letivo. Manifesta ilegalidade. Determinar o
cancelamento da matrícula de crianças e adolescentes em razão de falta
escolares, ainda que injustificadas, viola o direito de acesso à educação.
(Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – Recurso ex officio n. 60.258-0/6-
- Fazenda Pública do Estado de São Paulo e Ministério Público).
Mandado de Segurança – Ensino. Anulação de ato administrativo.
Indeferimento de matrícula em curso de língua estrangeira, ministrado pelo
Centro de Estudos de Línguas, da Secretaria Estadual da Educação, com
fundamento na Resolução n. 6, de 22/01/2003, que estabeleceu como
beneficiários do curso de línguas somente aqueles alunos matriculados na rede
pública de ensino. Alegação de incompatibilidade superveniente do impetrante
com o programa CEL diante do fato de não mais estar matriculado na rede
19
pública de ensino. Inadmissibilidade. Aluno carente que foi contemplado com
bolsa de estudos em escola da rede particular para o ensino médio.
Hipossuficiência não afastada. Ofensa aos dispositivos constitucionais que
garantem o acesso integral à educação. Segurança concedida. Decisão Mantida.
(Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação n. 465.757-5/4. Apelante:
Fazenda do Estado de São Paulo. Comarca de Araçatuba).
LICENÇA GESTANTE:
Mandado de Segurança – Adolescente – Estudante – Licença gestante
com prazo de 120 dias – Dirigente Regional de Ensino que concedeu
afastamento de apenas 90 dias, fundado na Lei n. 6.202/75. – Prazo de 120 dias
previsto no artigo 7º, inciso XVIII, da CF. Prevalência da norma constitucional.
Ordem concedida. Sentença mantida. (Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo. Apelação Cível n. 161.501-0/02 – Presidente Prudente. Apelante:
Fazenda do Estado de São Paulo. Apelado: Ministério Público.
PROGRESSÃO CONTINUADA
Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Estado de São
Paulo – Comarca de Várzea Paulista objetivando que o Estado e o Município
passem a adotar o sistema de avaliação dos alunos do ensino fundamental,
exigindo a comprovação, em média anual, de absorção de pelo menos 50% do
conteúdo ministrado, por matéria, fixando multa diária no caso do nãocumprimento da obrigação.
h. ESCOLAS PARTICULARES:
Além dos temas mencionados, existem outros que se referem especificamente as
escolas particulares. Na discussão que se trava com as escolas particulares, o
fundamento legal extrapola o já mencionado, ou seja, a Constituição Federal, LDB,
ECA, resoluções e portarias, incluindo como suporte o Código de Defesa do
Consumidor – Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990. As discussões travadas têm
ligação direta com eventual cobrança por parte das escolas. São exemplos de decisões
que bem demonstram esta relação.
Apelação – Cobrança – Prestação de serviços educacionais –
Comprovação do réu de cancelamento de matrícula solicitada pelo aluno. Tendo
20
a instituição de ensino demonstrado expressamente que o réu protocolou pedido
de cancelamento de sua matrícula, não há como exigir-se o pagamento das
mensalidades restantes. (Apelação cível n. 1117339-0/2, Santo André, TJSP,
Relatora: Des. Lino Machado)
Fornecimento de histórico escolar – Negativa ante a existência de débito
– Inadmissibilidade – Segurança concedida – Recurso improvido. (Apelação
cível n. 1160767-0/2, Ituverava, TJSP, Relator: Des. João Omar Marçura)
Mandado de Segurança – Prestação de serviços educacionais. Recusa de
fornecimento de certificado de conclusão de curso de ensino médio.
Inadmissibilidade. O caput do artigo 6º da Lei n. 9.870, de 23 de novembro de
1999, proíbe a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer
outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento. Além disso, a
negativa da autoridade impetrada atenta contra o artigo 205 da C.F., uma vez
que impede a continuidade dos estudos do impetrante. (Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo. Recurso n. 1.075.234.0/1. São Paulo).
Prestação de serviços – Aplicabilidade do Código de Defesa do
Consumidor à prestação de serviços educacionais – Multa limitada à 2% –
Desconto pontualidade que configura multa disfarçada e inadmissível “bis in
idem” – Retenção de documentos escolares – Dano moral – Indenização
reduzida – Recurso improvido.(Apelação cível n. 930565-0/9, São Jose do Rio
Preto,TJSP, Relator: Des. Eduardo Sá Pinto Sandeville)
Não pode a apelante, sem justa causa, recusar-se a fornecer os
documentos necessários para a transferência do apelado, uma vez que a Lei nº
9.870/99 no seu artigo 6º “caput” e §1º, proíbe a aplicação de penalidades em
razão de inadimplemento e, ainda, dispõe expressamente, que a instituição e
ensino tem o dever de expedir, a qualquer tempo, os documentos mencionados.
Recurso improvido (Apelação cível nº 1050329-0/4, São Paulo, Relator: Des.
Gomes Varjão)
Contrato de prestação de serviços educacionais – Diploma – Cobrança de
taxa para expedição – Ilegalidade. Conseqüência lógica da freqüência a qualquer
curso, de ensino fundamental, médio ou superior, é que, após a sua conclusão,
seja emitido o correspondente certificado ou diploma, cujo custo por nova
proveniente do Conselho Federal de Educação, presume-se incluído na
mensalidade. (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Comarca de
Bebedouro. Recurso n. 010107.
Cobranças ilegais ou abusivas, às vezes não se limitam a escolas particulares,
atingindo também as públicas. As decisões a seguir transcritas referem-se à cobrança
feita por escolas públicas.
21
MATÉRIA CONSTITUCIONAL – Acesso ao ensino fundamental e
médio – Garantia da gratuidade – Cobrança de taxa para inscrição ao exame
supletivo – Ilegalidade – Recurso parcialmente provido. (Apelação Cível n.
118.878-5 – São Paulo – 2ª Câmara de Direito Público – Relator: Alves
Bevilacqua – 20.06.00 – V.U.)
ACÃO CIVIL PÚBLICA – Exames supletivos – Taxa de inscrição –
gratuidade de ensino público (Constituição Federal, artigo 206, IV) – A norma
do artigo 206, IV, da Constituição Federal, de eficácia limitada, no que diz
respeito a educação de jovens e adultos (“ensino supletivo”) foi integrada pela
norma do artigo 37 da LDB, e assim é aplicável – As normas dos artigos 249, §
3º, e 250 da Constituição do Estado de São Paulo, estabelecem a gratuidade do
ensino supletivo fundamental e médio – Recurso do Ministério Público provido
para julgar procedente a ação. (Apelação Cível n. 76.640-0/1 – São Paulo –
Câmara Especial – Relator: Alvaro Lazzarini – 12.07.01 – U.V.) - ATO INFRACIONAL:
Diante da diversidade dos alunos que integram o sistema educacional, há que se
distinguir um ato infracional de um ato (in)disciplinar.
Ato infracional, define o Estatuto da Criança e do Adolescente:
Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou
contravenção penal.
Assim, toda infração prevista no Código Penal, na Lei de Contravenção Penal e
Leis Penais esparsas (ex. Lei de tóxico, porte de arma), quando praticada por uma
criança ou adolescente, corresponde a um ato infracional. O ato infracional, em
obediência ao princípio da legalidade, somente se verifica quando a conduta do infrator
se enquadra em algum crime ou contravenção prevista na legislação em vigor. Um dos
principais problemas que a escola pública enfrenta refere-se à ocorrência de ato
infracional quando se defronta com a questão da violência, sobretudo a física.
Hoje, mais do que nunca, diante das relações de conflitos existentes em nossa
sociedade, a escola passou a experimentar, com mais freqüência, a ocorrência de atos
infracionais. Quando esta situação se verifica, o problema sai da esfera escolar para
atingir o sistema de garantia de direitos, ou seja, o Conselho Tutelar (quando o ato
22
infracional for praticado por criança) ou a Policia (civil e militar), Ministério Público e
Poder Judiciário (quando o ato for praticado por adolescente)9
.
Estas situações acabam por judicializar ações envolvendo a escola, mas que
digam respeito à prática de crimes ou contravenções penais. Vários são os exemplos de
medidas aplicadas a adolescentes infratores que praticam ato infracional relacionados ao
ambiente escolar, como por exemplo, em caso de lesão corporal ou vias de fatos (por
brigas entre alunos, alunos e funcionários ou professores), desacato e injúria (ofensas
dirigidas aos alunos e aos professores), crimes de dano (quando danificam a escola ou
mesmo os veículos de professores), porte de entorpecente e de arma, tráfico de
entorpecente, etc.
Nestas hipóteses, quando o adolescente infringe a lei, é responsabilizado ficando
sujeito a uma das medidas sócio-educativas previstas no Estatuto da Criança e do
Adolescente:
Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente
poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:
I – advertência;
II – obrigação de reparar o dano;
III – prestação de serviços à comunidade;
IV – liberdade assistida;
V – inserção em regime de semi-liberdade;
VI – internação em estabelecimento educacional;
Assim, o adolescente envolvido com a prática de ato infracional na escola é
devidamente responsabilizado. A violência que resulta em ato infracional ultrapassa os
limites da escola e acaba por judicializar esta relação.
Quando a conduta não caracterizar ato infracional, deve ser analisada de forma
exclusiva pela própria escola em face do regimento escolar, como ato de indisciplina,
que deve ser considerado como:
9 Estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente que se considera criança a pessoa até 12 anos de
idade incompletos, e adolescente aquela entre 12 e 18 anos de idade (art. 2º).
23
Se entendermos por disciplina comportamentos regidos por um
conjunto de normas, a indisciplina poderá se traduzir de duas formas: 1)
a revolta contra estas normas; 2) o desconhecimento delas. No primeiro
caso, a indisciplina traduz-se por uma forma de desobediência insolente;
no segundo, pelo caos dos comportamentos, pela desorganização das
relações (LA TAILLE,1996, p 10).
Assim, a indisciplina escolar se apresenta como o descumprimento das normas
fixadas pela escola e demais legislações aplicadas (ex. Estatuto da Criança e do
Adolescente – ato infracional). Ela se traduz num desrespeito, seja do colega, seja do
professor, seja ainda da própria instituição escolar (depredação das instalações, por
exemplo).
- EVASÃO ESCOLAR:
Antes da vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente, os casos de evasão
escolar se restringiam à intervenção da própria escola.
A escola era competente para analisar o fato e utilizar os mecanismos
necessários para fazer o aluno voltar a estudar. Hoje, a situação é diferente, pois, os
casos envolvendo evasão escolar e elevados níveis de repetência devem ser
comunicados ao Conselho Tutelar e, na ausência de solução, ser levado ao
conhecimento do Poder Judiciário. Esta regra está prevista no artigo 56 do Estatuto da
Criança e do Adolescente. Implica esta intervenção judicial na busca da efetividade do
direito à educação.
São várias e as mais diversas as causas da evasão escolar ou infreqüência do
aluno. No entanto, levando-se em consideração os fatores determinantes da ocorrência
do fenômeno, pode-se classificá-las, agrupando-as, da seguinte maneira:
Escola: não atrativa, autoritária, professores despreparados, em número insuficiente,
ausência de motivação, etc.
Aluno: desinteressado, indisciplinado, com problema de saúde, gravidez, etc.
Pais/responsáveis: não cumprimento dos deveres decorrentes do poder familiar,
desinteresse em relação ao destino dos filhos, etc.
24
Social: trabalho com incompatibilidade de horário para os estudos, agressão entre os
alunos, violência em relação a gangues, etc.
Estas causas são concorrentes e não exclusivas, ou seja, a evasão escolar se
verifica em razão da somatória de vários fatores e não necessariamente de um
especificamente. Detectar o problema e enfrentá-lo é a melhor maneira para
proporcionar o retorno efetivo do aluno à escola.
Verifica-se em relação às causas que existem algumas de competência exclusiva
do sistema de justiça, como por exemplo, as relacionadas à violência, descumprimento
dos deveres referentes ao poder familiar, entre outras. Neste caso, a intervenção judicial
se faz necessária para garantir o aluno na escola, resultando desta relação a
judicialização de outro tema referente a educação. - QUALIDADE DA EDUCAÇÃO:
A Constituição Federal (art. 205), o Estatuto da Criança e do Adolescente (art.
53) e a LDB (art. 2º) traçou os seguintes objetivos para a educação:
desenvolvimento pleno da criança e do adolescente;
preparo para o exercício da cidadania;
qualificação para o trabalho.
O objetivo é dar uma diretriz única para os fins da educação e traz
implicitamente à tona a questão da qualidade do ensino, posto que somente uma
educação de qualidade pode favorecer esse desenvolvimento, bem como seu preparo
para a cidadania e qualificação para o trabalho. Um aluno que deixa o ensino
fundamental sem o conhecimento básico das disciplinas ministradas, sem saber ler e
escrever adequadamente, não se desenvolveu plenamente e pode ter comprometido a
sua qualificação para o trabalho.
Quando isso ocorre, ou seja, na hipótese da educação ministrada não atingir ou
não contemplar estes objetivos, questiona-se: Pode ser discutida no âmbito do poder
judiciário a qualidade da educação? Como discutir este tema?
25
A Constituição Federal apresenta de forma mais direta a questão da qualidade da
educação e os responsáveis pela mesma, quanto estabelece:
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
……..
VII – garantia de padrão de qualidade.
Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios
organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino.
§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios,
financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria
educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização
de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino
mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios;
§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na
educação infantil.
§ 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino
fundamental e médio.
§ 4º Na organização de seus sistemas de ensino, os Estados e os
Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a
universalização do ensino obrigatório.
§ 5º A educação básica pública atenderá prioritariamente ao ensino
regular
Desta forma, antes mesmo de discutir o que é qualidade da educação e se é
possível o questionamento legal da mesma, a Constituição Federal deixou clara quem
são os responsáveis por esta qualidade. Nesse sentido, esclarece CABRAL (2008, p.
105) quanto a organização do sistema de ensino:
Portanto, conforme a CF/88 e a organização do sistema de ensino
brasileiro, acima descrito, compete aos Municípios e ao Estado promover o
ensino fundamental de qualidade, o Município é responsável pelas séries
iniciais do ensino fundamental (primeira à quinta série) e o Estado pelas demais
séries (sexta a nona série), sendo que a União deve exercer a função
redistributiva e supletiva, de forma a garantir padrão mínimo de qualidade do
ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal
e aos Municípios, ou seja, a União em caso de oferta irregular por falta de
qualidade no ensino fundamental, responde judicialmente de forma concorrente,
solidária, com o Estado ou Município – dependendo da série em que se
promova a deficiência na qualidade educacional – sendo ambos responsáveis
pela promoção de uma educação de qualidade no ensino fundamental.
26
Esta questão é de extrema importância, posto que, não somente em relação a
qualidade da educação, mas todo e qualquer questionamento jurídico da educação no
Poder Judiciário deve levar em consideração o ente responsável pelo ensino que se
pretende questionar. Em outras palavras, quem é a parte legítima passiva para responder
a ação judicial que se vai ingressar. Isto porque, adverte CABRAL (2008, p. 105) que a
falta de conhecimento sobre quem é quem no âmbito da execução de nossos direitos,
das políticas públicas e, mais especificamente, do direito à educação, muitas vezes
inviabiliza o próprio exercício do direito.
Ciente de quem são os responsáveis pela educação, a segunda etapa consiste em
saber o que é qualidade e como este debate se realiza no Judiciário. É inegável que
todos os temas já abortados, como por exemplo, transporte escolar, merenda, falta de
professores, extinção de salas de aulas, etc, indiretamente tem uma ligação com a
questão da qualidade. Na verdade, todos os temas referidos resumem-se na busca da
qualidade da educação. Mas, esta questão vai além e é muito complexa, como bem
esclarecem Romualdo Portela de Oliveira e Gilda Cardoso de Araújo:
É muito difícil, mesmo entre os especialistas chegar-se a uma noção
do que seja qualidade de ensino […] provavelmente, essa questão terá
múltiplas respostas, seguindo valores, experiências e posição social dos
sujeitos. Uma das formas para se apreender essas noções de qualidade é
buscar indicadores utilizados socialmente para aferi-la. Nessa perspectiva,
a tensão entre qualidade e quantidade (acesso) tem sido o condicionador
último da qualidade possível, ou, de outra forma, a quantidade (de escola)
determina a qualidade (de educação) que se queira. (OLIVEIRA;
ARAÚJO, 2005, p. 6 e 8).
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9.394/96) estabelece:
Art. 3º. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
….
IX – garantia de padrão de qualidade;
Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado
mediante a garantia de: (…)
IX – padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos como a
variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao
desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem.
27
Constata-se que se trata de afirmação vaga e sem a consistência necessária para
colocar, no âmbito do Poder Judiciário, a discussão referente à qualidade da educação.
Como afirma Cury (2007a) esse padrão de qualidade deverá ter algum parâmetro de
referência até para se ter uma certa verificabilidade de resultado no âmbito do que é a
finalidade das instituições escolares.
Existem vários estudos referentes à qualidade da educação, levando-se em
consideração a questão do custo-aluno qualidade ou a qualidade aferida mediante testes
padronizados em larga escala10
. Na verdade, existem diversos indicadores para se aferir
a qualidade da educação. Como afirma Cury (2007a): a qualidade é, assim, um modo de
ser que afeta a educação como um todo envolvendo sua estrutura, seu desenvolvimento,
seu contexto e o nosso modo de conhecê-la.
Para a Justiça, o ideal seria o estabelecimento de mecanismos objetivos para
avaliação da qualidade do ensino, de modo a unificar a atuação do Judiciário, como por
exemplo, utilizando-se dos parâmetros mínimos estabelecidos por PINTO (2006), fixar
a análise por aluno, de modo que qualquer Juiz do País possa avaliar diretamente a
situação de seu município, levando-se em consideração:
Tamanho: considera-se que as escolas não devem nem ser muito
grandes (o que dificulta as práticas de socialização e aumenta a indisciplina),
mas, ao mesmo tempo, devem ter um número de alunos que permita à maioria
dos professores lecionar em apenas uma escola;
Instalações: assegurando-se salas ambientes (bibliotecas, laboratórios
etc), espaços de alimentação, lazer e de prática desportiva, com dotação
orçamentária para uma manutenção adequada;
Recursos didáticos em qualidade e quantidade, aqui incluídas as
tecnologias de comunicação e informação, garantidos os recursos para a
manutenção dos equipamentos;
Razão alunos/turma que garanta uma relação mais próxima entre os
professores e seus alunos;
Remuneração do pessoal: assegurar um piso salarial nacionalmente
unificado, associado ao grau de formação dos trabalhadores da educação e um
plano de ascensão na carreira que estimule a permanência na profissão;
Formação: dotação anual de recursos financeiros para a formação
continuada de todos os profissionais da escola;
10 Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB); Exame Nacional do Ensino Médio
(ENEM); Avaliação Nacional do Rendimento Escolar (ANRESC) e a Avaliação da Educação Básica
(ANEB). Em nível internacional, tem-se o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA).
28
Jornada de trabalho: definição de jornada semanal de 40 horas, com
20% da mesma, no caso do professores destinados a atividades de
planejamento, avaliação e reuniões com os pais, cumpridas nas escolas. No caso
das creches (0 a 3 anos), optou-se pela jornada padrão de 30 horas semanais
para os professores, também com 20% para atividades complementares;
Jornada do aluno: fixação de uma jornada mínima de 10 horas/dia, no
caso das creches (cuja média nacional já é superior a 8 horas/dia) e de 5
horas/dia, nas demais etapas (cuja média nacional é um pouco acima de 4
horas/dia);
Projetos especiais da escola: garantia de um repasse mínimo de
recursos para que as escolas possam desenvolver atividades próprias previstas
em seu projeto pedagógico;
Gestão democrática: entende-se que a gestão democrática envolve
uma série de aspectos que não possuem, necessariamente, um impacto
monetário no custo aluno, mas é evidente que quando se propicia a jornada
exclusiva do professor em uma escola, o tempo remunerado para atividades
extra-classe, a proximidade da escola das residências dos alunos, um menor
número de alunos/turma e de alunos/escola, todas estas medidas, facilitam
muito (embora não assegurem) a construção de relações mais democrática em
sala de aula e na escola. (PINTO, 2006)
Além destes indicadores, verificar o resultado dos índices dos testes
padronizados aplicados aos alunos.
Constata-se do exposto, que a questão da qualidade da educação é complexa e
talvez, por conta disso, afirma CABRAL (2008, p. 150) que não há nenhuma decisão
emitida pelos Tribunais Superiores brasileiros – Supremo Tribunal Federal e Superior
Tribunal de Justiça – sobre ações pleiteando a qualidade do ensino ou a
responsabilização do Poder Executivo pela falta de qualidade, em nenhum nível de
ensino.
Assim, não obstante o reconhecimento legal pela Constituição Federal e demais
legislação, da necessidade de uma educação de qualidade, no âmbito do Poder
Judiciário esta questão ainda não foi debatida como deveria.
Na verdade, o que se discute no Poder Judiciário é a não qualidade. Isto porque,
como diz Oliveira (2006)
… na falta de uma noção precisa de qualidade, é certo que tenhamos
acordo, no momento, no que diz respeito à constatação de sua ausência. (p. 55)
29
E a não qualidade, assevera Cury (2007ª) é a falta de escolas, é a falta de vagas
nas escolas, são as barreiras excludentes da desigualdade social inclusive legais como
era o caso dos exames de admissão, a discriminação que desigualava o ensino
profissional, os limites do ensino não – gratuito e a descontinuidade administrativa. A
não qualidade se expressou e ainda está presente nas repetências sucessivas
redundando nas reprovações seguidas do desencanto, da evasão e abandono. Como diz
Oliveira (2006): passávamos da exclusão da escola para a exclusão na escola.
Em síntese, o debate sobre a qualidade da educação no âmbito judicial ainda está
centrada em situações pontuais como a falta de vagas, falta de professores, transporte,
merenda, etc. Não se constata uma análise mais ampla no sentido de se discutir uma
ação afirmativa que pontue todas estas questões sob o signo da qualidade.
- CONSEQÜÊNCIAS DA JUDICIALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO
É inegável que, em razão desta relação estabelecida entre a justiça e educação,
várias são as conseqüências para os atores envolvidos. Merecem destaque as seguintes
hipóteses:
7.1. SISTEMA DE EDUCAÇÃO.
a) Transferência de responsabilidade – Grande parte das questões
escolares e que devem ser solucionadas na própria escola, são transferidas para a esfera
judicial. Os responsáveis pela educação não assumem o compromisso que é próprio da
educação em esgotar os recursos internos baseados no diálogo. Exemplo típico desta
situação refere-se à questão da violência. Hoje, muitos casos encaminhados à justiça
revestem-se mais de características de ato de indisciplina do que ato infracional. A
escola, muitas vezes, sequer esgota os mecanismos previstos no próprio regimento
escolar, preferindo provocar a atuação do Judiciário, Ministério Público, Autoridade
Policial e Conselho Tutelar. Sendo ato de indisciplina, a competência para analisá-lo
continua sendo da própria escola e não do sistema de garantia de direitos.
b) Desconhecimento da legislação relacionado à criança e ao
adolescente: outra questão da judicialização da educação diz respeito a este
30
desconhecimento legal. Várias são as situações em que a escola provoca a instituição
errada para o encaminhamento das ocorrências. Provoca-se o Poder Judiciário ou
Ministério Público quando, na verdade, o caso deveria ser encaminhado ao Conselho
Tutelar. Desconhecem as atribuições do sistema de garantia de direitos. Há também
situações em que este desconhecimento legal acaba por levar ao Judiciário ou Conselho
Tutelar, situações que não poderiam ser encaminhadas, antes do esgotamento das
medidas administrativas. No mesmo sentido, ocorre esta hipótese quando da instauração
de procedimento em face do aluno e não são obedecidos os princípios constitucionais
básicos da ampla defesa e do contraditório.
Vale lembrar que não está se pretendendo que todo e qualquer profissional da
educação tenha o conhecimento do direito. No entanto, toda legislação que lhe diga
respeito diretamente, não pode ser ignorada. Exemplo desta situação ocorre com o
capítulo do direito à educação previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, que
não pode ser desconhecido do educador.
Como afirma Batista (1999, p. 233) os graves problemas da escola brasileira
não podem ser solucionados sem a ação dos profissionais que nela trabalham. Mas,
neste caso, tais profissionais devem ter ciência da legislação relacionada a sua atuação.
c) Trabalho em parceria: Não há como negar que a tarefa educativa é de
competência do professor. Contudo, vários problemas que ocorrem na escola, antes
mesmo de se transformarem em questões judiciais, podem ser resolvidos com um
trabalho conjunto do sistema educativo (diretores, coordenadores, supervisores e
professores) com o sistema de proteção dos direitos da criança e do adolescente
(Conselho Tutelar, Poder Judiciário, Ministério Público, Policia Militar e Civil). Nesse
sentido, vale destacar Batista (1999, p. 237) quando afirma que o pedagogo precisa
estar preparado para ações integradas com os demais profissionais e com o espaço
educativo como um todo, assim como para o entendimento da realidade e a produção
de saberes pedagógicos com vistas à construção de práticas educativas que veiculem os
conhecimentos e valores necessários à sociedade contemporânea.
31
Até porque, os problemas escolares deixaram de ser eminentemente
educacionais, os problemas sociais converteram-se em problemas escolares e os
professores não estão preparados pra enfrentar essa nova realidade (ALMEIDA, 1999,
p. 12). O enfrentamento destes problemas deve ocorrer de forma conjunta. Todos em
prol de uma educação de qualidade.
7.2. SISTEMA DE PROTEÇÃO:
a) Desconhecimento do sistema educacional: Nesta situação, ocorre o
inverso do que foi mencionado no item anterior, ou seja, o despreparo dos integrantes
do sistema de proteção – Juiz de Direito, Promotor de Justiça, Delegado de Polícia,
Policial Militar, Conselheiro Tutelar e Conselheiro Municipal. Desconhecem o sistema
de ensino e há um despreparo para lidar com os problemas da educação. Para muitos
integrantes deste sistema, o problema educacional ainda está restrito ao professor. Se a
escola é ruim ou não atrativa, se ela não apresenta educação de qualidade, se os alunos
são indisciplinados: a culpa é do professor transformado em culpado de todos os
fracassos escolares.
Nesse sentido, aponta Almeida (1999, p. 11):
Os professores foram transformados em verdadeiros bodes expiatórios
frente aos imensos problemas presentes nos sistemas de ensino, favorecendo o
enfraquecimento de sua profissionalização e do seu reconhecimento social..
Responsabilizá-lo pelos insucessos da escola atende a vários interesses, dentre
eles aos dos governantes, que podem se eximir das responsabilidades quanto ao
que acontece; aos dos pais, que não em que enfrentar os problemas escolares
com seus filhos; aos dos pesquisadores, que não precisam rever a direção de
suas pesquisas, em boa parte sem sintonia com a realidade escolar.
Mesmo posicionamento aponta Esteve (1995, p. 104):
Grande parte da sociedade, alguns meios de comunicação e também
alguns governantes chegaram à conclusão simplista e linear de que os
professores, como responsáveis diretos do sistema de ensino, são também os
responsáveis diretos de todas as lacunas, fracassos, imperfeições e males que
nele existem.
32
Acabam por culpar o professor e consequentemente a escola pelo fracasso do
aluno. Conforme esclarece SCHÖN (1997, p.79): atribuímos à culpa às escolas e aos
professores, o que equivale a culpar as vítimas. Sim, porque outros fatores se somam
para apontar a situação atual da escola como financiamento, retribuição salarial,
jornada, carreira e condições de trabalho entre outras. A aplicação da lei na esfera
educacional requer do profissional do direito o conhecimento real da situação
educacional, sob pena de cometer erros e equívocos.
b) Exagero na forma de agir: existe ainda a situação em que, na ânsia de
provocar a defesa do direito à educação, os integrantes do sistema de proteção
extrapolam na judicialização dos atos, instaurando protocolados, inquéritos civis,
procedimentos judiciais de situações que não deveriam merecer a atenção do sistema de
justiça. Nesta hipótese, há uma indevida invasão do sistema legal no educacional.
c) Burocratização das ações: num mundo informatizado e dinâmico, as
instituições jurídicas ainda convivem, em sua grande maioria, com um sistema
retrogrado e burocratizante. As relações entre este sistema e o educacional ficam muitas
vezes emperradas. Exemplo típico desta intervenção burocrática diz respeito ao combate
a evasão escolar. Quando ocorre a efetiva intervenção, muitas vezes é tardia, posto que
a criança e o adolescente não mais têm condições de voltar ao sistema de ensino. - CONSIDERAÇÕES FINAIS
Afirma PIMENTA (2000, p. 23) que a educação é um processo de humanização
que ocorre na sociedade humana com a finalidade explícita de tornar os indivíduos
participantes do processo civilizatório e responsáveis por levá-lo adiante. Enquanto
prática social é realizada por todas as instituições da sociedade. Enquanto processo
sistemático e intencional ocorre em algumas, dentre as quais se destaca a escola.
A garantia da educação, como um direito social e público subjetivo, decorre de
ações e medidas na esfera política e administrativa. A ausência de política pública que
garanta o processo educacional, realizada de forma sistemática pela escola, acaba por
acarretar medidas judiciais que interferem no cotidiano educacional. Poderia se indagar,
33
diante desta situação: Não estaria o Poder Judiciário invadindo atribuições exclusivas do
Poder Executivo? A resposta é dada pelo Desembargador Roberto Vallim Bellocchi,
quando afirma: É função essencial do Poder Judiciário, por intermédio da atividade
jurisdicional reconhecer os direitos subjetivos dos jurisdicionados e lhes conceder
tutela útil e efetiva. Em outras palavras, o respeito aos direitos subjetivos dos cidadãos
legitima o Poder Judiciário a imposição de comandos a todos aqueles, incluindo o
Estado, que vierem a molestá-los (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
Apelação civil n. 107.397-0/0-00, comarca de Bauru).
Ademais, esclarece CABRAL (2008, p. 148):
… os juízes são impelidos a agir sobre assuntos políticos referentes à
Administração Pública, pois houve uma evolução das expectativas dos cidadãos
a respeito da responsabilidade política.
Esta relação que se firma entre a educação e a justiça na sociedade
contemporânea está muito evidente, conforme ficou demonstrado pelas decisões citadas
quando se está em questão a existência de um molestamento de direitos pelos
responsáveis. Contudo, extrapola o Poder Judiciário, sendo que outras instituições
também se apresentam relevantes na garantia do direito à educação, podendo ser citado
como exemplo o Ministério Público. Apenas a título de ilustração, em levantamento
realizado junto ao Conselho Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo,
constatou-se no período de 01 de janeiro de 2008 a 19 de agosto de 2008 que foram
protocolados 628 expedientes relacionados à área da Infância e da Juventude. Deste
total, 288 referem-se à questão educacional, o que representa um total de 45,85%. Em
vários Estados da federação, o Ministério Público está organizado de forma a
contemplar Centros de Apoio aos Promotores de Justiça na área da educação. Esta
informação revela como o tema educação tem se apresentado para as instituições
jurídicas, como o Ministério Público, que integra o sistema de garantia dos direitos da
criança e do adolescente.
Em síntese, pode-se afirmar que a judicialização da educação representa a busca
de mais e melhores instrumentos de defesa de direitos juridicamente protegidos. Essa
34
proteção judicial avança na consolidação desse direito da criança e do adolescente e
significa a exigência da obrigatoriedade da transformação do legal no real.
35 - REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
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