Acessibilidade em imóveis: Questionamentos

Acessibilidade em imóveis: Questionamentos

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ACESSIBILIDADE EM IMÓVEIS: QUESTIONAMENTOS
Luiz Antonio Miguel Ferreira1

  1. LEIS APLICÁVEIS. A Constituição de 2008 introduz a acessibilidade
    determinando à lei dispor sobre as normas de construção (Art. 227, § 2º) e adaptação
    (Art. 244) dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de
    transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas com deficiência.
    Seguiram-se as seguintes leis e regulamentos:
    a) Lei nº 7.853/89 – dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua
    integração social, sobre a CORDE, institui a tutela jurisdicional de interesses
    coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público,
    define crimes e dá outras providências, regulamentada pelo Decreto nº 3.298/99.
    b) Leis nº 10.048/00 e 10.098/00 – estabelecem normas gerais e critérios básicos
    para a promoção de acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com
    mobilidade reduzida, regulamentadas pelo Decreto nº 5.296/04.
    Com fundamento no Art. 2º, V, da Lei nº 7.853/89, que impõe a adoção e a
    efetiva execução de normas que garantam a funcionalidade das edificações e vias
    públicas para as pessoas com deficiência e permitam o acesso destas a edifícios,
    logradouros e meios de transporte, é que se busca garantir administrativamente e, se for
    necessário judicialmente, a acessibilidade da pessoa com deficiência em prédios de uso
    público e privados destinados ao uso coletivo.
    Ressalte-se que a norma nos faz compreender que o impedimento ou a ausência
    de acessibilidade não está na pessoa, mas, no ambiente que deve sofrer os ajustes
    necessários para a garantia da plena inclusão.
  2. QUE IMÓVEIS DEVEM SER ADAPTADOS. A Constituição utiliza a
    terminologia edifícios de uso público, ou seja, o edifício público (que naturalmente é de
    uso público) e o privado que se destina ao público. A lei nº 10.098/00 e o Decreto nº
    5.296/04 tratam dos edifícios públicos ou privados destinados ao uso coletivo, como
    também edifícios de uso privado e edificações de uso privado multifamiliar. O Decreto
    nº 5.296/04, além das designações mencionadas, traz o conceito de edificações de uso
    coletivo. Tratam-se na verdade de categorias de imóveis (Art. 8º, Decreto nº 5.296/04):
     Edifícios de uso público e edifícios públicos: bens públicos para o Código Civil
    (Art. 98) são aqueles pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno.
    Pelo Decreto são aqueles bens imóveis administrados por entidades da
    administração pública, direta e indireta, ou por empresas prestadoras de serviços
    públicos e destinados ao público e geral.
     Edifícios privados são aqueles destinados à habitação, que podem ser
    classificadas como unifamiliar (uma residência por lote), multifamiliar (mais de
    uma habitação por lote – condomínios verticais e horizontais, por exemplo) e os
    conjuntos residenciais.
     Edifícios de privados destinados ao uso coletivo: O Código Civil (Art. 98) diz
    que tirando os bens públicos mencionados, os demais são todos particulares, ou
    seja, de natureza privada. Estes bens podem ser utilizados de forma

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Promotor de Justiça da Pessoa com Deficiência do Ministério Público do Estado de São Paulo.
Especialista em direitos difusos e coletivos pela ESMP. Mestre em educação pela UNESP. Autor do livro
O Estatuto da Criança e do Adolescente e o Professor (Ed. Cortez).- junho/2008.
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exclusivamente privada, como por exemplo, uma moradia familiar; como
também podem ser transformados em comércios, com a utilização de uso
coletivo.
 Edificações de uso coletivo: aquelas destinadas às atividades de natureza
comercial, hoteleira, cultural, esportiva, financeira, turística, recreativa, social,
religiosa, educacional, industrial e de saúde, inclusive as edificações de
prestação de serviços de atividades da mesma natureza.
Ressalte-se que o imóvel inicialmente de natureza privada se for transformado
para destinação de uso coletivo deve necessariamente sofrer as adaptações.

  1. O QUE DEVE CONTER UM IMÓVEL ACESSÍVEL. O imóvel acessível não
    deve conter barreiras que são os entraves ou obstáculos que limitem ou impeçam o
    acesso, a liberdade de movimento ou a circulação, com segurança, da pessoa com
    deficiência. As barreiras apresentadas no entorno e interior dos imóveis de uso público e
    coletivo, e no entorno e nas áreas internas de uso comum nas edificações de uso privado
    multifamiliar, constituem-se em barreiras nas edificações.
    A acessibilidade estará garantida uma vez observadas as especificações das
    Normas Técnicas da ABNT: NBR 9050 – Acessibilidade a Edificações Mobiliário,
    Espaços e Equipamentos Urbanos , entre outras.
    A acessibilidade deve ser garantida às pessoas com deficiência física, visual,
    auditiva, mental e múltipla e, basicamente é garantida com: rampas de acesso ao
    imóvel; elevadores de acesso à área externa do imóvel (equipamento eletromecânico de
    descolamento vertical) como também internamente; sanitários; piso tátil e direcional;
    estacionamento ou garagens reservados; escadas com corrimão e circulação interna
    acessível. A avaliação da acessibilidade é feita por profissional técnico da área
    (engenheiro ou arquiteto).
  2. IMÓVEIS ANTIGOS, COM PLANTAS APROVADAS ANTES DAS
    EXIGÊNCIAS LEGAIS, TAMBÉM DEVEM SER ADAPTADOS. Todos os
    imóveis devem ser adaptados à pessoa com deficiência, pouco importando se a sua
    planta foi aprovada pela municipalidade antes do advento da nova lei. Isto porque, a
    Constituição estabelece duas regras claras: uma para os imóveis a serem edificados e
    outra para adaptação dos imóveis já construídos. Logo, não há exclusão de nenhum
    imóvel. É necessária a emissão de carta de habite-se, ou habilitação equivalente para a
    sua renovação mesmo se tiver sido emitida antes das exigências de acessibilidade
    contidas na atual legislação (Art. 13, § 2º, Decreto nº 5.296/04).
  3. EXISTEM IMÓVEIS QUE NÃO DEVEM SER ADAPTADOS OU QUE NÃO
    COMPORTAM ADAPTAÇÃO? Não, imóveis de uso público ou privados destinados
    ao uso coletivo devem ser adaptados. A lei não traz exceções. O que se verifica na
    prática é que alguns imóveis antigos, construídos sem qualquer planejamento de
    acessibilidade, encontrarão maiores dificuldades para a sua adaptação e apresentarão um
    custo mais elevado na reforma para garantir tal direito. No entanto, com os recursos
    existentes na área da engenharia, pode-se afirmar que todo e qualquer imóvel pode ser
    adaptado à pessoa com deficiência. Eventual recusa do proprietário em adaptar o
    imóvel, deverá ser questionada judicialmente.
  4. IMÓVEIS TOMBADOS. Os imóveis tombados também foram incluídos entre
    aqueles que devem sofrer adaptações, segundo a Lei nº 10.098/00, Art. 25. A restrição
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    fica por conta das especificidades do bem. Em áreas ou elementos onde não seja
    possível promover a adaptação para torná-los acessíveis ou visitáveis, deve-se garantir o
    acesso por meio de informação visual, auditiva ou tátil. No caso de sítios considerados
    inacessíveis ou com visitação restrita, devem ser oferecidos mapas, maquetes, peças de
    acervo originais ou suas cópias, sempre proporcionando a possibilidade de serem
    tocados para compreensão tátil (Guia prático de acessibilidade. CD – Fernando
    Gonçalves de Castro – MP/SP).
  5. APROVAÇÃO DE PLANTAS E ALVARÁ DE FUNCIONAMENTO. Para a
    aprovação, licenciamento ou emissão de certificado de conclusão de projeto
    arquitetônico ou urbanístico (habite-se) deverá ser atestado o atendimento às regras de
    acessibilidade previstas nas normas técnicas da ABNT (Arts. 10, § 2º; 13, § 2º, Decreto
    nº 5.296/04). O mesmo ocorre para a obtenção ou renovação do alvará de
    funcionamento (para qualquer atividade – Art. 13, § 1º, Decreto nº 5.296/04).
  6. RESPONSABILIDADE TÉCNICA. É do engenheiro ou arquiteto, responsável
    pelo projeto arquitetônico ou obra, sendo que eventual falsidade sobre a existência de
    acessibilidade implicará em responsabilidade, inclusive do proprietário do imóvel que
    utilizar a planta, sabendo ser falsa as afirmações ali lançadas (Art. 11, Decreto nº
    5.296/04).
  7. COMPENSAÇÃO FINANCEIRA PELA ADAPTAÇÃO DO IMÓVEL. Pode o
    proprietário exigir uma indenização por parte do poder público em imóveis cuja planta
    foi aprovada sem adaptação e antes da exigência da nova lei? Embora a doutrina tenha
    teses a favor e contra (José dos Santos Carvalho Filho, Manual de Direito
    Administrativo, 7ª edição, Rio de Janeiro, 2001, Lumenjuris, pág. 428; Celso Antonio
    Bandeira de Melo, Curso de Direito Administrativo, 19ª Edição, São Paulo, 2005,
    Malheiros Editores, pág. 940/941; Maria Silvia Zanella Di Pietro, Direito
    Administrativo, 11ª edição, São Paulo, Ed. Atlas, 1999, pág. 508; Adriano Aparecido
    Arrias de Lima, Responsabilidade civil do Estado pela edição de ato legislativo,
    http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9702), não se vislumbra a possibilidade de
    responsabilização do Poder Público. As leis que especificaram a questão da
    acessibilidade para a pessoa com deficiência foram editadas por força da Constituição e
    buscam dar efetividade ao princípio da igualdade.
  8. JURISPRUDÊNCIA.
    AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DEFICIENTE FÍSICO – ACESSO À ESCOLA (andar das
    salas de aula) dificultado por escada. Infringência ao artigo 227, § 2º da Constituição
    Federal, que determina a eliminação de barreiras que impeçam o livre acesso dos
    deficientes – Recurso provido. (Apelação Com Revisão 2202215100; Relator(a):
    Antonio Carlos Malheiros; Comarca: Comarca não informada; Órgão julgador: 3ª
    Câmara de Direito Público; Data do julgamento: Não disponível; Data de registro:
    24/05/2006)
    AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DEFICIENTE FÍSICO – NBR 9.050/94; LF 8.275/75; DE
    n° 20.811/83 e DM n° 10.874/74 – Construção de rampas de acesso em todos os
    compartimentos da escola – Adaptação de banheiros e colocação de corrimãos nas
    escadas existentes – 1. Deficientes físico: Acesso. Remoção de barreiras e obstáculos ao
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    acesso de deficientes físicos a próprios estaduais foi disciplinada no Estado pela LE n°
    3.710/83 (com a redação dada pela LE n° 5.500/87) e pelo DE n° 27.383/87, tornando
    desnecessário o acesso à Constituição Federal ou à legislação federal. Desnecessário,
    em conseqüência, definir se os dispositivos constitucionais ou legais federais são de
    eficácia contida ou de eficácia plena.. (Apelação Com Revisão 2736395100; Relator(a):
    Não disponível; Comarca: Comarca não informada; Órgão julgador: 7ª Câmara de
    Direito Público; Data do julgamento: Não disponível; Data de registro: 26/04/2005;
    Apelante: Fazenda Estadual Apelado: Ministério Público Origem: 1ª Vara Cível
    (Ribeirão Preto) – Processo n° 1.985/00 Juiz: Márcia Blanes).
    EMBARGOS INFRINGENTES – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – REALIZAÇÃO DE
    OBRAS PARA PERMITIR O INTEGRAL ACESSO DOS DEFICIENTES EM
    PRÉDIO ESCOLAR – Inteligência do art 244 do CF/S8 – Aplicação do princípio da
    razoabilidade – Inexistência de previsão orçamentária – Negado provimento ao recurso,
    nos termos do acórdão. (Embargos Infringentes 2275915101; Relator(a): Não
    disponível; Comarca: Comarca não informada; Órgão julgador: 9ª Câmara de Direito
    Público; Data do julgamento: Não disponível; Data de registro: 16/09/2004).

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONDIÇÕES PARA ACESSO A EDIFÍCIOS.
OBRIGAÇÃO DE FAZER POR PARTE DO ESTADO. Arts.227, par.2° e 244 da
CF788 e Leis Estaduais n°s 5.500 de 31.12.1986 e 9086 de 03.3.1995. Recurso de
apelação provido. (Apelação Com Revisão 2442535200; Relator(a): Gama Pellegrini;
Comarca: Comarca não informada; Órgão julgador: 3ª Câmara de Direito Público; Data
do julgamento: Não disponível; Data de registro: 09/06/2004).
AÇÃO CIVIL PÚBLICA – REMOÇÃO DE BARREIRAS ARQUITETÔNICAS EM
ESCOLA PÚBLICA PARA GARANTIR O PLENO ACESSO DE PESSOAS
PORTADORAS DE DEFICIÊNCIA – Sentença de procedência mantida, com fixação
de prazo para as obras necessárias, estabelecendo muita após o término do prazo para
conclusão das obras – Recurso parcialmente provido. (Apelação Com Revisão
2074775300; Relator(a): Peiretti de Godoy; Comarca: Comarca não informada; Órgão
julgador: 3ª Câmara de Direito Público; Data do julgamento: Não disponível; Data de
registro: 03/10/2003).